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Opinião
Segunda - 09 de Janeiro de 2017 às 08:55
Por: Paulo Lemos

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A receita da violência generalizada que está deflagrada dentro e fora das prisões é de fácil compreensão, basta ter um cérebro para pensar. E de largada já dá para vaticinar que ninguém está certo nessa guerra, tampouco ganha alguma coisa com ela. Se há vitória, ela é de Pirro.

São mal-tratos do lado de dentro. Ataques do lado de fora. Quem ganha com isso?

E ainda tem gente que defende o recrudescimento carcerário como técnica de solução do problema da criminalidade. Só defende isso ou quem não conhece a realidade ou quem é cúmplice dela, ou seja, ou por ignorância ou por má-fé. Não tem meio-termo.

Para além dos inúmeros casos de tortura relatados pela própria Organização das Nações Unidas (ONU), Anistia Internacional (AI) e outras organizações insuspeitas, mediante denúncias recebidas, apuradas e processadas, como seria endurecer mais as condições de tratamento dentro dos cárceres superlotados, absolutamente insalubres e sem qualquer perspectiva de ressocialização? Colocar todos de mãos para cima, de frente para uma parede, e metralhar, depois de chicotear?

Sei que alguns gostariam que isso ocorresse. São tão ou mais criminosos e doentes do que aqueles que eles condenam. Isso não é justiça. É vingança e, até mesmo, perversão, sadismo. É sério que alguém defenda isso em pleno século XXI, no Ocidente?

Foi a partir do método de repressão máxima dentro dos presídios que surgiram o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC). É só pesquisar um pouco, que as coisas começam a clarear. Em escala global, foi a guerra do Iraque, patrocinada e promovida pelos EUA, que deu ensejo ao Estado Islâmico.

Não precisa ser muito inteligente para entender que violência sempre vai gerar mais violência, independente de onde venha, se do Estado, da sociedade ou da família.

É óbvio que quem comete um crime, de maneira dolosa ou culposa, tem de arcar com as consequências. Não pode e não deve ficar isento de responsabilidade, a não ser que se enquadre numa das hipóteses de excludente de ilicitude já previstas na legislação pátria correlata à matéria.

Entretanto, esse mesmo alguém que errou, se comprovado carecer de capacidade psicoemocional de voltar para o seio da população, em casos excepcionais, poderão ficar por prazo indeterminado sobre égide de medidas de segurança, cabível, por exemplo, para um pedófilo confesso e irrecuperável, segundo laudos técnicos satisfatórios. Fora desses casos, seja o que for que tenha feito, o foco deve ser a ressocialização, conforme prescreve a Constituição.

No entanto, o sistema prisional não oferece condições mínimas para isso. Não fosse suficiente, o egresso de qualquer prisão sofre forte preconceito do lado de fora, o que compromete sua reinserção social.

Além disso, temos ainda as causas do crime, estudadas pela criminologia e outras ciências.

E qualquer um que tenha um mínimo de conhecimento sobre o assunto sabe que o buraco é bem mais embaixo, do que alguns pretendem fazer crer quando defendem a Lei de Talião.

Enfim, precisamos elevar o nível do debate e da reflexão; parar de simplesmente ficar repetindo a mesma coisa, que nem papagaio, sem demandar algum esforço para desvendar o problema, que é de todos nós, presos e não presos. Afinal de contas, antes de ser preso, o sujeito era alguém que estava entre nós. Ninguém está imune a essa possibilidade.

Por exemplo, você pode amanhã ou depois matar alguém, sem querer, contudo, por imperícia, imprudência e/ou negligência, e ir preso. Pode se envolver num conflito dentro de casa e ir preso. Pode ser flagrado dirigindo embriagado e ir preso. Pode dar um cheque que no dia da compensação não tenha fundos ou esteja indevidamente sustado e ir preso por estelionato. Pode atrasar a pensão alimentícia e ir preso. Pode se relacionar com uma menor de idade e ir preso. Pode defender a morte de presos e ir preso, por incitação à violência e apologia ao crime de homicídio.

São muitas as possibilidades.

Todos somos seres humanos. E todos somos, em parte, vítimas e culpados pela conjuntura que nos cerca. No entanto, enquanto cada um ficar olhando para o seu umbigo, apenas atirando pedra e gritando "- pega ladrão!" - e depois mata -, nada vai mudar, só vai piorar.

Violência sempre vai gerar mais violência. E todos que a defendem e/ou a praticam, contra presos ou não presos, sejam "homens de bem" ou "homens de mal", são criminosos e devem responder por isso. A vida não é maniqueísta e niilista como alguns enxergam. Ela é bem mais complexa do que a Lei de Talião.

Paulo Lemos é advogado em Mato Grosso e presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da 14a Subsecção da OAB/MT.

(paulolemosadvocacia@gmail.com)



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