Repórter News - www.reporternews.com.br
Politica Brasil
Quinta - 25 de Maio de 2006 às 19:50

    Imprimir


A senadora Serys Marli (PT-MT) apresentou no Senado Federal projeto de lei que visa disciplinar a investigação criminal, os meios de obtenção de prova e os procedimentos judiciais aplicáveis ao crime organizado, com garantia de respeito ao devido processo legal.

A proposta da senadora petista procurar suprir as lacunas legais no que se refere à tipificação do crime organizado, articulando preceitos fixados em legislações específicas, notadamente no que se refere aos meios de obtenção de prova.

Para Serys, deverão ser tipificados como crime organizado as seguintes práticas: promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, associação (...) de 5 ou mais pessoas, (...) para obter, com o emprego de violência, ameaça, fraude, tráfico de influência ou atos de corrupção, vantagem de qualquer natureza ". Entre os crimes que se agregam ao tipo estão relacionados, entre outros, o tráfico de entorpecentes, o terrorismo, o contrabando de armas, a extorsão mediante seqüestro, o tráfico de mulheres e de crianças, a lavagem de dinheiro, o homicídio qualificado, os crimes contra o sistema financeiro nacional e contra o meio ambiente.

Em sua proposta, Serys não hesita em propor a supressão do instituto da "infiltração policial" (previsto no art. 2o, V, da Lei nº 9.034 de 3 de maio de 1995), por entender que viola o patamar ético-legal do Estado Democrático de Direito. "Regido que é pelos princípios da legalidade e da moralidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), é inconcebível que o Estado brasileiro admita e determine que seus agentes policiais pratiquem, como co-autores, atos criminosos sob o pretexto da formação da prova", argumenta Serys ao condenar a prática da infiltração policial, na justificativa do projeto.

A proposição prevê, também, que o interrogatório do acusado preso sob a suspeita de integrar organização criminosa poderá ser realizado no estabelecimento prisional em que se encontrar, desde que garantidas a segurança do juiz, a presença do advogado e a publicidade do ato.

A ÍNTEGRA Leia, a seguir, a íntegra do projeto apresentado pela senadora Serys: PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 150, DE 2006 Dispõe sobre a repressão ao crime organizado e dá outras providências. O CONGRESSO NACIONAL decreta: Capítulo I DO CRIME ORGANIZADO Art. 1º Esta Lei define o crime organizado e dispõe sobre a investigação criminal, meios de obtenção de prova, crimes correlatos e procedimento criminal a ser aplicado.

Art. 2º Promover, constituir, financiar, cooperar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, associação, sob forma lícita ou não, de cinco ou mais pessoas, com estabilidade, estrutura organizacional hierárquica e divisão de tarefas para obter, direta ou indiretamente, com o emprego de violência, ameaça, fraude, tráfico de influência ou atos de corrupção, vantagem de qualquer natureza, praticando um ou mais dos seguintes crimes:

I - tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica (Lei nº 6.368, de 21 de outubro de 1976); II - terrorismo; III - contrabando ou tráfico ilícito de armas de fogo, acessórios, artefatos, munições, explosivos ou materiais destinados à sua produção (Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997); IV - extorsão mediante seqüestro e suas formas qualificadas (art. 159, caput e §§ 1º, 2º e 3º, do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal); V - contra a administração pública (arts. 312, caput e § 1º, 313-A, 313-B, 314, 315, 316, caput e § 2º, 317, 318, 319, 320, 321, 325, 326, 332, 334, 335, 337, 337-A, 337-B, 337-C, 342, 344 e 347 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal); VI - contra o sistema financeiro nacional (Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986, salvo o parágrafo único do art. 4º); VII - contra a ordem tributária ou econômica (arts. 1º a 6º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990); VIII - contra as empresas de transporte de valores ou cargas e a receptação dolosa dos bens ou produtos auferidos por tais práticas criminosas; IX - lenocínio e tráfico de mulheres (arts. 227 a 231 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal); X - tráfico internacional de criança ou adolescente (art. 239 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990); XI - lavagem de dinheiro, ocultação de bens, direitos e valores (Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998); XII - tráfico ilícito de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano (Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997); XIII - homicídio qualificado (art. 121, § 2º, do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal); XIV - falsificação, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e §§ 1º, 1º-A e 1º-B, do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal);

XV - contra o meio ambiente e o patrimônio cultural (Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998); XVI - outros crimes previstos em tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja parte.

Pena - reclusão, de cinco a dez anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes aos demais crimes cometidos.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem, por meio do crime organizado: I - gere, direta ou indiretamente, ou controla, de qualquer modo, atividades econômicas ou serviços públicos com o fim de auferir proveito econômico;

II - frauda licitações, em qualquer de suas modalidades, ou concessões, permissões e autorizações administrativas; III - intimida ou influencia, por qualquer dos modos de execução referidos no caput deste artigo, testemunhas ou funcionários públicos responsáveis pela apuração de atividades do crime organizado; impede ou dificulta, valendo-se dos mesmos modos, a investigação do crime organizado;

IV - financia campanhas políticas destinadas à eleição de candidatos com a finalidade de garantir ou facilitar as ações do crime organizado ou a impunidade de seus membros.

§ 2º Nas mesmas penas incorre, ainda, quem fornece, oculta ou tem em depósito armas, munições e instrumentos destinados ao crime organizado; quem lhe proporciona locais para reuniões ou, de qualquer modo, alicia novos membros.

§ 3º A pena é aumentada de um terço até a metade: I - se a estrutura do crime organizado for constituída por mais de vinte pessoas; II - se, na atuação do crime organizado, houver emprego de arma de fogo, concurso de agente público responsável pela repressão criminal ou colaboração de criança ou adolescente;

III - se qualquer dos concorrentes for funcionário público, valendo-se o crime organizado dessa condição para a prática de infração penal;

IV - se o produto ou proveito da infração penal destinar-se, no todo ou em parte, ao exterior.

§ 4º A pena é aumentada de metade para quem exerce o comando, individual ou coletivo, do crime organizado, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução.

§ 5º Se qualquer um dos concorrentes do crime organizado for funcionário público, o recebimento da denúncia quanto a ele, após a defesa preliminar no prazo de dez dias, poderá provocar o afastamento cautelar do exercício de suas funções, sem prejuízo de remuneração e dos demais direitos previstos em lei, até o julgamento final da ação penal.

§ 6º A condenação acarretará ao funcionário público a perda do cargo, função, emprego ou mandato eletivo, e a interdição para o exercício de função ou cargo público pelo dobro do prazo da pena aplicada.

Capítulo II

DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E

DOS MEIOS DE OBTENÇÃO DA PROVA Art. 3º Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros já previstos em lei, os seguintes meios de obtenção da prova:

I - colaboração premiada do investigado ou acusado; II - interceptação de comunicação telefônica e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, nos termos da legislação específica;

III - ação controlada; IV - acesso a registros de ligações telefônicas, dados cadastrais, documentos e informações eleitorais, comerciais e de provedores da internet;

V - quebra dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, nos termos da legislação específica. Parágrafo único. Os meios de obtenção de provas mencionados nos incisos II a V dependerão de prévia autorização judicial.

Seção I

Da colaboração premiada

Art. 4º O juiz, de ofício ou a requerimento das partes, poderá conceder o perdão judicial e declarar extinta a punibilidade do investigado ou acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado, alternativamente:

I - a identificação dos demais co-autores e partícipes do crime organizado e das infrações penais por eles praticadas; II - a revelação da estrutura organizacional hierárquica e da divisão de tarefas; III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades do crime organizado; IV - a recuperação total ou parcial do produto da infração penal; V - a localização da eventual vítima com a sua integridade física preservada. Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do colaborador e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.

Art. 5º O juiz poderá ainda, presentes os requisitos dos incisos I a V do artigo anterior, reduzir de um terço a dois terços a pena do investigado ou acusado que tiver colaborado voluntariamente na investigação policial ou no processo criminal.

Art. 6º São direitos do colaborador: I - usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica; II - ter seu nome, sua qualificação e demais informações pessoais preservados durante a investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em contrário;

III - ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais co-autores e partícipes; IV - participar das audiências sem contato visual com os outros acusados; V - não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito;

VI - cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais co-réus ou condenados.

Seção II

Da ação controlada

Art. 7º Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial relativa à ação praticada por crime organizado ou a ele vinculado, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.

§ 1º O retardamento da intervenção policial será imediatamente comunicado ao juiz que, se for o caso, estabelecerá seus limites, após a manifestação do Ministério Público.

§ 2º A comunicação será sigilosamente distribuída de forma a não conter informações que possam indicar a operação a ser efetuada.

§ 3º O acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Público e à autoridade policial, como forma de garantir o sigilo das investigações.

Art. 8º Se a ação controlada envolver transposição de fronteiras, o retardamento da intervenção policial somente poderá ocorrer quando as autoridades dos países que figurem como provável itinerário do investigado oferecerem garantia contra a sua fuga e o extravio de produtos ou substâncias ilícitas transportadas.

Seção III

Do acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações

Art. 9º A autoridade policial ou o Ministério Público, no curso da investigação policial ou da ação penal, poderão requerer, de forma fundamentada, a autorização do juiz para a obtenção de registros de ligações telefônicas, dados cadastrais, documentos e informações eleitorais, comerciais e de provedores da internet.

Parágrafo único. No caso de recusa por parte do detentor da informação requisitada, o juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial, expedirá mandado de busca e apreensão.

Art. 10. As empresas de transporte possibilitarão, pelo prazo de cinco anos, acesso direto e permanente do juiz, do Ministério Público e da autoridade policial aos bancos de dados de reservas e registro de viagens.

Art. 11. As concessionárias de telefonia fixa ou móvel manterão, pelo prazo de cinco anos, registros de identificação dos números dos terminais de origem e de destino das ligações telefônicas internacionais, interurbanas e locais. Seção IV

Dos crimes ocorridos na investigação criminal e na obtenção de prova

Art. 12. Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização por escrito.

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. Art. 13. Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura de crime organizado que sabe inverídicas.

Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa.

Art. 14. Quebrar o sigilo das investigações que envolvam a ação controlada. Pena - reclusão, de dois a quatro anos, e multa.

Art. 15. Recusar, retardar ou omitir dados cadastrais, documentos e informações eleitorais, comerciais ou de provedores da internet, requisitados por comissão parlamentar de inquérito ou por autoridade judicial.

Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

Art. 16. Revelar o nome, a qualificação ou demais informações pessoais da vítima, testemunha, investigado ou acusado-colaborador que tenha a sua identidade preservada em juízo, assim como quebrar o sigilo do respectivo procedimento judicial.

Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa.

Capítulo III

DO PROCEDIMENTO CRIMINAL

Art. 17. O crime organizado e as infrações penais conexas serão apurados mediante procedimento ordinário previsto no Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, observadas as disposições especiais do presente Capítulo.

Art. 18. O interrogatório do acusado preso poderá ser feito no estabelecimento penal em que se encontrar, em sala própria, desde que garantidas a segurança do juiz, de seus auxiliares e dos demais participantes, a presença do defensor e a publicidade do ato.

Parágrafo único. Antes da realização do interrogatório, o juiz assegurará o direito de entrevista reservada, e por tempo de até trinta minutos, do acusado com o seu defensor.

Art. 19. O juiz poderá determinar, em decisão fundamentada, durante o inquérito policial ou no processo criminal, a preservação do nome, endereço e demais dados de qualificação da vítima ou de testemunhas, assim como do investigado ou acusado colaborador.

§ 1º Não será admitida a preservação da identidade se não houver notícia de práticas de atos de intimidação ou indícios de riscos resultantes dos depoimentos ou declarações prestados.

§ 2º A medida de que trata o caput deste artigo poderá ser decretada de ofício, mediante representação da autoridade policial ou a pedido do Ministério Público, da vítima, da testemunha, do investigado ou acusado colaborador e de seu defensor.

Art. 20. O pedido para a preservação da identidade será autuado em apartado, em procedimento sigiloso, ouvido o Ministério Público no prazo de vinte e quatro horas, decidindo o juiz em igual prazo.

§ 1º Se o pedido resultar de representação da autoridade policial ou de requerimento na fase de inquérito policial, será encaminhado ao juízo competente contendo o nome, endereço e demais dados de qualificação do beneficiário, que passará a ser identificado nos autos por meio de um código correspondente ao seu nome.

§ 2º O Ministério Público fará constar da denúncia o código correspondente à pessoa que tem a sua identidade preservada.

§ 3º Os mandados judiciais serão elaborados e cumpridos por funcionário, designado pelo juiz, que deverá fazê-los, em separado, individualizados, garantindo que o nome e o endereço das pessoas preservadas permaneçam desconhecidos.

§ 4º Os mandados cumpridos serão entregues ao escrivão do cartório judicial, que procederá a juntada no procedimento instaurado para a preservação da identidade.

§ 5º Os autos do pedido de preservação ficarão sob a guarda da Corregedoria-Geral da Justiça, podendo a eles ter acesso apenas o juiz, o Ministério Público, a autoridade policial e o defensor da pessoa protegida.

Art. 21. O juiz poderá autorizar, a requerimento da defesa e se entender imprescindível, ante as circunstâncias do caso concreto, a revelação do nome e do eventual apelido da vítima, da testemunha e do acusado-colaborador, mediante decisão fundamentada, após a concordância da pessoa protegida e de seu defensor, e manifestação do Ministério Público.

Art. 22. Determinada a medida de que trata o art. 19 desta Lei, os depoimentos das testemunhas, as declarações da vítima e as respostas do investigado ou acusado colaborador apenas terão relevância probatória quando roborados por outros meios de prova.

Art. 23. O prazo para encerramento da persecução criminal, nos processos por crime de que trata esta Lei, será de cento e vinte dias quando o réu estiver preso.

Art. 24. O Juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial, ouvido o Ministério Público em vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens, direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do Decreto-Lei 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.

§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas se a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da data em que ficar concluída a diligência.

§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens direitos e valores apreendidos ou seqüestrados, quando comprovada a licitude de sua origem.

Art. 25. O juiz, na hipótese de sentença condenatória, decidirá fundamentadamente, com base em elementos do processo, sobre a necessidade do acusado recolher-se à prisão para apelar.

Capítulo IV DISPOSIÇÕES FINAIS Art. 26. O sigilo da investigação criminal poderá ser decretado pela autoridade judicial competente, para garantia da celeridade e da eficácia das diligências investigatórias.

Parágrafo único. Determinado o depoimento do investigado, seu advogado terá prévia vista dos autos, com tempo suficiente para o conhecimento completo da investigação.

Art. 27. Legislação específica disporá sobre a regulamentação dos procedimentos desta Lei relativos à competência e atribuições do órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência - SISBIN.

Art. 28. O art. 288 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de l940 - Código Penal, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 288. Associarem-se três ou mais pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer infração penal.

Pena - reclusão, de dois a quatro anos.

Parágrafo único. A pena será aumentada de metade se houver emprego de arma de fogo ou participação de criança ou adolescente. (NR)"

Art. 29. O art. 342 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de l940 - Código Penal, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 342. ................................................................... Pena - reclusão, de dois a quatro anos, e multa. ......................................................................................... (NR)" Art. 30. Esta Lei entra em vigor quarenta e cinco dias após a sua publicação. Art. 31. Revoga-se a Lei nº 9.034, de 3 de maio de l995. JUSTIFICAÇÃO

Diante da difícil, mas necessária tarefa de definir, para efeitos penais, o conceito de "crime organizado", resolvemos apresentar o presente projeto de lei, que pretende disciplinar a investigação criminal, os meios de obtenção de prova e o procedimento judicial aplicável ao referido crime, sem desrespeito às garantias do devido processo legal, tampouco às atribuições constitucionais dos órgãos envolvidos na persecução criminal.

De início, convém salientar que a proposta diverge de outras iniciativas legislativas que escolheram o verbo "associar" como núcleo do tipo penal em construção. Ora, não nos parece que as idéias participantes do vocábulo "associar" sejam suficientemente explícitas para a compreensão mais abrangente do fenômeno delitivo que mereça o nomen iuris de "crime organizado" (não obviamente de "organização criminosa", que possui um sentido mais sociológico do que jurídico-penal). O fato criminoso a ser descrito não se resume à mera reunião, agregação, partilha ou divisão de alguma coisa, ou seja, na conduta de união, em si mesma, de um certo número de pessoas, mas sim na ação precedente de promover, constituir, financiar, cooperar ou integrar essa associação.

Antes de tudo, é mister que se explicitem os verbos que constituem o núcleo do tipo penal, os quais retratam condutas humanas que evidenciam a aludida prática criminosa. Para tanto, recorreu-se a cinco verbos que também são desprovidos de carga de ilicitude, mas que adquirem tal característica quando postos em conexão com os outros elementos da composição típica. Promover quer dizer "ser a causa de, gerar, provocar"; constituir significa "formar, organizar, criar"; financiar designa a idéia de "sustentar os gastos (de, com), prover o capital necessário para; custear, bancar"; cooperar representa "atuar, juntamente com outros para um mesmo fim, contribuir com trabalho, esforços, auxílio, colaborar"; e integrar exprime o conceito de "incluir-se um elemento no conjunto, formando um todo coerente, incorporar-se, integralizar".

A primeira indagação é saber quem poderia realizar tais ações. A figura criminosa não descreve pessoa determinada, com características próprias para ser o sujeito ativo do crime organizado. Qualquer um pode, em tese, atuar no crime organizado, e não apenas pessoalmente, mas também através de interposta pessoa. Nada impede, portanto, que alguém possa agir às ocultas, colocando-se por detrás do operar criminoso. O que não se admite é que uma pessoa isolada baste para a configuração típica. Trata-se, no caso, de um crime plurissubjetivo que exige o número mínimo de cinco pessoas. Assim, no momento em que houver a convergência de vontades entre cinco ou mais pessoas para a constituição do crime organizado, o tipo dar-se-á por consumado.

Note-se que o "promover", o "constituir", o "financiar", o "cooperar" e o "integrar" só passam a ter relevância típica quando se vinculam a um determinado objeto, qual seja, uma associação que não prescinde de algumas características próprias: a) ser constituída de cinco ou mais pessoas. Essa pluralidade de pessoas, como dissemos, é inafastável; b) apresentar estrutura organizacional estável e hierarquizada, bem como divisão de tarefas entre seus integrantes. É imprescindível que a associação possua um mínimo de organização de pessoas e de meios e tenha uma certa estabilidade, isto é, tenha a duração temporal necessária para a realização de sua finalidade, ou, dito de melhor forma, revele ser algo autônomo que ultrapasse um acordo de vontades meramente ocasional; c) ter caráter tanto lícito quanto ilícito, pois nada obsta que a forma de estruturação da associação siga as regras exigíveis para a sua constituição legal. Isso permitirá que sejam reprimidas as atividades criminosas perpetradas por meio de empresa juridicamente construída.

Sabe-se, ainda, que crime organizado, para que possa atingir seu escopo, emprega determinados modos de execução. Há um espectro muito amplo de modus operandi. Freqüentemente, vale-se da violência, da força intimidativa, da manobra fraudulenta, do tráfico de influência ou mesmo de atos de corrupção. Infelizmente, não há como negar a estreita ligação entre o crime organizado e a corrupção.

Os incisos I a XVI do art. 2° da proposição relacionam os vários delitos que o crime organizado pode empreender. No que se refere aos crimes contra a administração pública, crimes contra o sistema financeiro e crimes contra a ordem econômica ou tributária, entendemos melhor limitar os tipos que ensejam a atuação do crime organizado. É que várias figuras típicas incluídas entre os crimes contra a administração pública, como também o art. 4º da Lei 7.492, de 1986, e mesmo os crimes contra as relações de consumo, não traduzem as formas mais reprováveis de associação criminosa. Em contrapartida, o projeto não ignora diversas condutas que, por sua natureza, devem ser equiparadas ao crime organizado (vide art. 2º, §§ 1º e 2º).

Com relação aos meios de obtenção de prova, entendemos que a interceptação das comunicações telefônicas e a quebra dos sigilos financeiro, bancário e fiscal já estão disciplinados em legislações específicas (Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, e Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001), as quais, indubitavelmente, oferecem um melhor tratamento da matéria. Não haveria razão, portanto, para desconsiderar o marco legal em vigor. Daí recorrermos à remessa para a legislação específica (art. 3º, II e V).

No que se refere à colaboração premiada, o projeto manteve-se fiel à idéia de que a extinção da punibilidade ou a redução da pena devem partir do Poder Judiciário. A nosso sentir, afigura-se inconstitucional a proposta de atribuir tal competência ao órgão acusador. Isso implicaria verdadeiro esvaziamento de poder, função e atividade do órgão judicial, com flagrante desrespeito à garantia de que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito" (art. 5º, XXXV, da CF) e, no âmbito processual, afronta à cláusula do devido processo legal (art. 5°, LIV, da CF).

A proposta não hesita, ainda, em suprimir o instituto da "infiltração policial" do direito brasileiro (art. 2º, V, da Lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995), porque viola o patamar ético-legal do Estado Democrático de Direito, sendo inconcebível que o Estado-Administração, regido que é pelos princípios da legalidade e da moralidade (art. 37, caput, da CF), admita e determine que seus membros (agentes policiais) pratiquem, como co-autores ou partícipes, atos criminosos, sob o pretexto da formação da prova. Se assim fosse, estaríamos admitindo que o próprio Estado colaborasse, por um momento que seja, com a organização criminosa na execução de suas tarefas, o que inclui até mesmo a prática de crimes hediondos. Muito melhor será que o Estado-Administração, localizando uma organização criminosa, ao invés de infiltrar nela seus agentes, debele essa organização, seja de forma imediata ou retardada (através de ação controlada).

Não bastassem as razões constitucionais, éticas, legais e lógicas já destacadas, ainda é possível opor outros argumentos de ordem prática contra a "infiltração de agentes". A situação mais grave será o desrespeito a qualquer limite jurisdicional imposto à atuação dos agentes infiltrados. Imagine-se, por exemplo, quando o agente infiltrado estiver na presença de criminosos e lhe for ordenada a prática de um crime (v. g., o homicídio de um traficante preso pela organização rival). Nessa situação, o agente não terá como escolher entre cometer e não cometer o crime (limite imposto judicialmente), pois, se não obedecer aos integrantes da organização, poderá simplesmente ser executado. É isso que o Estado pretende de seus agentes? É isso que podemos esperar de um Estado Democrático de Direito? É isso que podemos denominar por "moralidade pública"?

Resta destacar que os mais experientes policiais já são conhecidos dos criminosos, logo, as pessoas escolhidas para essa difícil missão, de escolher entre a própria "ida" ou o desrespeito aos limites judiciais definidos para a sua atuação, serão policiais recém ingressos na carreira, sem qualquer experiência e ainda com bases ético-profissionais não solidificadas, o que, não resta dúvida, poderá propiciar o surgimento de "agentes duplos".

Quanto ao acesso a dados cadastrais, registros, documentos e informações, o projeto pautou-se pela estrita obediência aos preceitos constitucionais, notadamente ao art. 5º, X, XI e XII, da CF. Em que pese inexistir garantia absoluta em nosso ordenamento jurídico, caberá ao órgão judicial ponderar, no caso concreto, o conflito entre os direitos individuais e o interesse coletivo. Tal responsabilidade não poderia ficar a cargo do órgão policial ou do Ministério Público, cujas funções, na persecução criminal, são bem outras. A fórmula adotada é, seguramente, a mais adequada para evitar devassas injustificadas e medidas afoitas (art. 3º, parágrafo único).

Em termos do procedimento penal, o art. 18 da proposição prevê que o interrogatório do acusado preso poderá ser realizado no estabelecimento prisional em que se encontrar, em sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, auxiliares e demais participantes, a presença do defensor e a publicidade do ato, assegurando-se, ainda, o direito de entrevista reservada, por tempo de até trinta minutos, do acusado com seu defensor.

A matéria relativa ao direito de apelar em liberdade foi disciplinada em consonância com o princípio da presunção de não-culpabilidade (art. 5º, LVII, da CF). Ao contrário do texto legal em vigor, sobre o qual pairam fortes dúvidas de inconstitucionalidade ("o réu não poderá apelar em liberdade", art. 9º da Lei nº 9.034, de 1995), preferimos uma redação mais equilibrada e compatível com o referido princípio constitucional, atribuindo ao juiz o dever de justificar a necessidade da prisão provisória antes do trânsito em julgado da condenação (art. 25).





Fonte: Da Assessoria

Comentários

Deixe seu Comentário

URL Fonte: https://www.reporternews.com.br/noticia/298916/visualizar/