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Politica Brasil
Quarta - 01 de Dezembro de 2004 às 16:51

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A recomendação de uma reforma do Estado na América Latina é uma das conclusões de relatório "A Democracia na América Latina: Rumo a uma democracia de cidadãs e cidadãos" divulgado no início do ano pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). O documento avaliou a consolidação da democracia na região e concluiu que é "imprescindível considerar a questão do poder do Estado e sua capacidade para democratizar e para construir a cidadania". Especialistas brasileiros avaliam que o ponto fundamental para essa reforma é a promoção de uma descentralização de poder, com atenção ao desenvolvimento regional.

A pesquisa do PNUD entrevistou 19.500 pessoas em 18 países. Segundo o estudo, cerca de 70% dos latino-americanos entrevistados defendem uma maior ação do Estado na economia de seus países. A ex-secretária de Políticas de Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional, Tânia Bacelar, avalia que o Estado brasileiro deve assumir o papel de promover as políticas regionais para reduzir as desigualdades.

"Uma sociedade democrática assegura à maioria da população uma vida digna. No Brasil, você tem o corte social: é nítido que uma parte da sociedade não tem oportunidade. Mas tem também o corte regional. O combate à desigualdade regional deve ser uma política de Estado, porque o mercado não fará isso."

O relatório identificou, no entanto, que grande parte dos líderes latino-americanos reconhece a diminuição do poder do Estado e de sua capacidade de responder às demandas da população. Entre os 231 líderes entrevistados pelo PNUD, 79,7% deles avaliam que os grupos econômicos e o setor financeiro são um dos elementos que limitam o poder real dos governantes.

Os líderes citam ainda o peso dos meios de comunicação, as igrejas, os sindicatos, poderes ilegais como o narcotráfico, além dos organismos multilaterais de crédito, como Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional.

Para Tânia Bacelar, os compromissos financeiros dos países latino-americanos têm restringido a capacidade do Estado de mediar os conflitos e propor políticas. "A política que os estados praticam hoje beneficia muito mais os credores da dívida. E não os credores da dívida social". Segundo o PNUD, para recuperar esse papel e atender às demandas sociais da população, o Estado precisa se modernizar para ampliar a democracia.

O cientista político e professor do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), Wanderley Guilherme dos Santos, considera, entretanto, que a recomendação de promover a reforma do Estado não é suficiente. Santos afirma que o desafio para consolidar a democracia no país é universalizar os direitos sociais garantidos pelo Constituição.

"Não há ninguém no mundo contemporâneo que não esteja de acordo com o fato de que cada um dos Estados nacionais precisa de uma reforma. Isso não tem nenhuma especificidade na América Latina, muito menos no Brasil. Todas as pesquisas sobre democracia na Europa e Estados Unidos apontam que, entre os motivos pelos quais a democracia está sendo vista com certa antipatia pelo eleitorado, é porque o Estado está inoperante", afirma.

O professor propõe que seja realizado um amplo debate sobre as características do Estado que poderão garantir sua capacidade de implementar as políticas públicas. "Há uma série de políticas sociais que, a cinco quilômetros de Brasília, já não tem mais valor. Para mim, essa é uma discussão séria sobre democracia."

A reforma do Estado deveria qualificar a administração pública para torná-la mais eficiente, sem diminuir a interferência do Estado nas questões nacionais, avalia o cientista político da PUC e Fundação Getúlio Vargas, Fernando Abrucio.

"Se olharmos as necessidades da população, a administração pública até precisaria ter uma melhor estrutura, em alguns casos com mais funcionários públicos. A questão fundamental é ter uma administração pública de qualidade, baseada em uma gestão por resultados, profissionalizada e democrática, com participação da população e controle dos governantes. O tamanho do Estado é algo menor diante desses pontos", defende.

Abrucio entende ainda que as relações entre governo federal, estados e municípios devem garantir mais eficácia às administrações públicas. Na sua opinião, mais do que rever a divisão de recursos entre os entes da federação, é preciso garantir o bom uso do dinheiro público.

"O pacto federativo é importante para a democracia latino-americana porque a descentralização se tornou um tema fundamental da política da região. É fundamental ter governos subnacionais fortes e democráticos. Nesse sentido, no primeiro ano do governo Lula se colocou em pauta o fortalecimento e a maior democratização desses governos subnacionais. É preciso melhorar a qualidade da administração pública nos estados e municípios do Brasil, mas é preciso da participação deles. Não pode ser um projeto centralizador. E deve ter dois objetivos: ter uma administração pública mais eficiente e mais participativa."

A reforma do Estado e sua relação com o federalismo será um dos temas da conferência internacional "Democracia Participação Cidadã e Federalismo", promovida pela Secretaria-Geral da Presidência da República e pelo PNUD em Brasília, nos dias dias 2 e 3 de dezembro. Intelectuais e políticos de pelo menos oito países, além de quatro ministros brasileiros participarão do evento.




Fonte: Agência Brasil

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