Articulação na Santa Casa abre caminho para pedido de renúncia do atual provedor Com 100 irmãos favoráveis, já é possível pedir novas eleições para trocar a atual gestão
O atual provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, o advogado Kalil Rocha Abdalla, pode estar com os dias no cargo contados. Membros da instituição já conseguiram reunir cerca de 120 assinaturas para convocar uma assembleia geral extraordinária e colocar a renúncia de Abdalla em pauta.
Segundo um empresário e membro da irmandade que preferiu não ser identificado, “basta um quinto dos irmãos favoráveis, conforme regimento da instituição, para protocolar o requerimento na provedoria”.
— Conseguimos as cem assinaturas no final do ano passado. Porém, muitos irmãos, que estavam viajando por conta das férias, souberam da movimentação e mostraram interesse em participar. Por isso, resolvemos esperar para coletar outros nomes e dar mais força ao documento.
Outro membro da irmandade e também médico da Santa Casa há 40 anos acredita que “para resgatar a credibilidade da instituição, provedoria e mesa administrativa precisam ser substituídas”.
— Duvido que exista alguém desonesto na mesa administrativa e até acho que ninguém sabia da situação real, mas como conselheiros deveriam fiscalizar. Não sou juiz nem policial, mas as auditorias mostraram os fatos, por isso assinei o requerimento.
O médico recorda o período de crise que a instituição e o corpo clínico passaram no final do ano passado, "sem agulha para aplicar o medicamento no paciente e material para realizar alguns procedimentos e cirurgias".
A articulação dos membros da irmandade começou após as diversas denúncias de superfaturamento e irregularidades na administração da entidade. A crise financeira foi agravada durante a gestão de Abdalla, quando o déficit passou de R$ 80 milhões para R$ 800 milhões.
Para o empresário, “foi uma surpresa para muitos de nós [irmãos] saber que a Santa Casa tinha tantas dívidas e irregularidades, como apontou a auditoria encomendada pela Secretaria Estadual da Saúde”.
— Era de conhecimento de muitos irmãos que a gestão do Kalil precisava de mudanças e estava ineficiente, mas não tínhamos conhecimento de tanta irregularidade.
Como funciona a gestão
A irmandade da Santa Casa é constituída por cerca de 500 integrantes de várias categorias e escolhidos entre membros da sociedade. A cada três anos, é eleita a mesa administrativa composta por apenas 49 deles e o provedor, que atuam como uma espécie de conselheiros e têm a função de fiscalizar e controlar o patrimônio da instituição filantrópica e privada.
No momento, são esses irmãos que estão com o poder nas mãos para mudar a história da Santa Casa, já que, o gestor não é remunerado por sua função e, portanto, não pode ser demitido.
Caso Abdalla anuncie a renúncia definitiva ao final da licença de 90 dias que pediu em dezembro do ano passado, deverão ser convocadas novas eleições para a provedoria, na qual os 500 membros da irmandade elegem o novo líder da maior instituição filantrópica da América Latina, explica o empresário.
— Na história do hospital, a tradição é sempre ter uma única chapa. Apenas em duas ocasiões a Santa Casa contou com uma oposição, sempre com o Kalil concorrendo.
À frente da Santa Casa desde 2008 e reeleito em abril do ano passado, o atual provedor ocupa pela terceira gestão consecutiva o cargo, que é equivalente ao diretor principal da entidade.
Pelas regras, qualquer irmão pode montar uma chapa com 50 nomes da irmandade e se candidatar ao cargo até cinco dias antes das eleições, conforme o estatuto da entidade. No entanto, até o momento não há candidatos.
Destituição do atual provedor
Outra maneira de convocar uma assembleia extraordinária seria 51% da mesa administrativa se mostrar favorável à saída de Abdalla. A terceira forma seria o vice-provedor, Ruy Altenfelder, fazer o pedido formalmente. No entanto, ele assumiu a cadeira de Abdalla nesse período de afastamento do cargo, “sem contar que eles são da mesma chapa”, lembra o cardiologista Bruno Bueno, funcionário que integra o movimento Santa Casa Viva, criado também para pedir a renúncia do provedor.
— O grande problema da Santa Casa hoje é a falta de credibilidade e a única maneira disso voltar é trocar toda a gestão. Por isso, estamos esperançosos que os irmãos exerçam seu poder.
Um membro da diretoria da Santa Casa que preferiu não ser identificado concorda que “a entidade perdeu a credibilidade perante a opinião pública” e pede mudanças.
— A população e o corpo clínico estão sendo penalizados. Precisamos de uma solução imediata.
Assim como ele, o médico e membro da irmandade é otimista e acredita na modernização do sistema de gestão.
— O estatuto da empresa é muito antigo e precisa de ajustes. Na pior crise, quem sabe isso aconteça e salve a Santa Casa. Estamos na torcida para o hospital sair dessa situação.
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