Uma hora e meia após zarpar do porto Boizão, em Manaus (AM), o barco The Flash pifou e ficou à deriva no rio Amazonas. Faltavam ainda 30 minutos para chegar a Manaquiri, cidade de 21 mil habitantes onde Maurício de Aquino deveria entrevistar 14 pessoas para o Datafolha.

O resgate aos 50 passageiros veio uma hora depois na forma da lancha Glória a Deus, que navegava ao som de Bruno e Marrone.

Embora mais rápida que o The Flash, a nova embarcação não evitou o atraso. Aquino chegou ao seu destino com pouco tempo para fazer as entrevistas.

"Precisei correr para conseguir pegar o barco de volta para Manaus. Como a cidade é pequena e cheguei quase na hora do almoço, acabou sendo fácil abordar as pessoas", conta Aquino.

No Datafolha desde 2003, Aquino é um dos 192 pesquisadores externos que cobriram 162 cidades brasileiras para a pesquisa publicada ontem. Afora os resultados em si, eles constituem a face mais perceptível do instituto.

Estrutura

Mas o trabalho do Datafolha é garantido por uma estrutura invisível que envolveu, no caso dessa pesquisa, 313 profissionais responsáveis pelo planejamento do processo, recebimento e processamento dos dados e checagem das informações, entre outras tarefas.

Ao longo do ano, o instituto Datafolha conta com uma equipe fixa de cerca de cem pessoas e realiza aproximadamente 500 pesquisas, a maioria das quais não são eleitorais, mas de mercado.

Enquanto tocava a pesquisa de intenção de voto, o Datafolha mantinha outros 35 projetos em andamento.

Entre as primeiras reuniões para elaboração dos questionários e a publicação do resultado transcorreram 12 dias. Nesse meio-tempo, o segredo foi uma das principais obsessões do instituto.

A data de publicação dos resultados da pesquisa, por exemplo, não é conhecida pela maior parte da Redação até dias antes da veiculação.

O segredo é ainda maior quando se trata dos resultados da pesquisa: pessoas envolvidas diretamente na produção das reportagens e na edição de textos e artes só têm acesso aos números duas ou três horas antes do fechamento do jornal, às 21h.

O próprio editor-executivo da Folha, Sérgio Dávila, só soube dos resultados às 16h10 de sexta-feira, embora Mauro Paulino, diretor-geral do Datafolha, já conhecesse os números na véspera.

"A gente trata esse processo como uma operação de guerra. Eventuais vazamentos seriam muito graves. Isso se justifica porque o mundo político usa o Datafolha como verdadeira pedra de toque para confirmar ou negar tendências no cenário eleitoral", afirma Dávila.

Entre as 18h e as 20h de sextas-feiras que antecedem a publicação, Paulino costuma receber telefonemas de colunistas da própria Folha e de outros veículos em busca de informação. Em vão.

Na Redação, a "operação de guerra" se mostra justificada. Por volta das 19h30, repórteres da Folha (que não conheciam o resultado) eram procurados por assessores de políticos que tentavam saber notícias sobre a pesquisa.

Há outras etapas menos visíveis do processo que exigem igual segredo.

É o que ocorre com o sorteio das cidades e dos pontos de fluxo onde serão feitas as pesquisas. Nesse caso, a intenção não é evitar vazamentos, mas garantir que ninguém tente interferir na aplicação dos questionários.

Incidentes

Quando o segredo é impossível, como quando os pesquisadores já estão em campo, pede-se discrição. Há exemplos históricos de pesquisadores que acabaram presos em pequenas cidades, nas quais suas presenças chamavam muita atenção.

Pequenos incidentes desse tipo são a contrapartida da metodologia do Datafolha, o diferencial do instituto na opinião de seu diretor-geral.

"Fazemos pesquisa nas ruas, e não em domicílio, por ser mais rápido, mais ágil e porque é cada vez mais difícil entrar em condomínios de luxo ou em favelas. Assim conseguimos abordar eleitores do topo e da base da pirâmide social que não seriam entrevistados de outra forma."