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Terça - 20 de Abril de 2010 às 09:34
Por: Steffanie Schmidt

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João Vieira
Célio simula como se posicionou para atirar em policial
Célio simula como se posicionou para atirar em policial
O ex-policial militar Célio Alves de Souza, 44, foi condenado a 12 anos e 6 meses de reclusão por tentativa de homicídio contra o major PM Evandro Ferraz Lesco, ocorrida em julho de 2007. Célio acertou o braço e parte do ombro do policial durante a operação que realizou sua captura, na fronteira com a Bolívia. Na ocasião, ele portava uma espingarda calibre 12, cano cerrado, e a identidade do irmão, Valter da Silva. Pelos crimes de porte ilegal de arma de uso restrito e de uso de identidade alheia, Célio foi absolvido. O júri popular foi realizado em Cáceres (225 km a oeste de Cuiabá).

Com a decisão, o ex-policial militar acumula agora 100 anos e 6 meses de reclusão. A defesa já recorreu da sentença. De acordo com o advogado, Waldir Caldas, o recurso de apelação seguirá para o Tribunal de Justiça, que avaliará 3 questionamentos apresentados: o mérito da decisão, a quantidade da pena aplicada e a negativa da manifestação de nulidade, requerida pela defesa.

"O artigo 88 do Código de Processo Penal é claro ao afirmar que o réu que cometeu crimes no exterior tem que ser julgado na comarca onde reside. No caso do Célio, o fórum de competência é Cuiabá", explicou Caldas.

O local onde o ex-policial foi preso, se dentro do território brasileiro ou na Bolívia, foi a tônica dos debates durante quase 12 horas de julgamento.

Para o promotor Samuel Frungilo, a pena aplicada atendeu as expectativas da acusação. Ele rebateu a tese da defesa de que Célio teria agido em legítima defesa. "Ao acatar esse tese os jurados estarão afirmando que os policiais que realizaram a prisão, no cumprimento de seu dever, estariam agindo de forma ilegal para que Célio tivesse motivos de se defender".

A tese levantada pela defesa era de que Célio não teria reconhecido os policiais militares, no momento em que recebeu voz de prisão, agindo instintivamente ao disparar contra o então capitão Lesco. "Eles estavam à paisana e não apresentavam nenhuma uniformização que os identificasse", afirmou Caldas.

Lesco foi responsável por realizar várias escoltas de Célio em audiências. O coronel PM Zaqueu Barbosa, o cabo João Ricardo Soler e o soldado Vilson da Silva, testemunhas arroladas pela acusação, afirmaram que todos os policiais utilizavam colete balístico no momento da operação. "É um colete utilizado pelo Gaeco, preto com inscrições amarelas. Os policiais estavam identificados", afirmou Lesco.

Bate-boca - A dúvida sobre o local onde ocorreu a prisão de Célio foi motivo de troca de ofensas entre o promotor Samuel Frungilo e o advogado Waldir Caldas. Na visão da defesa, a prisão do ex-policial militar ocorreu na Bolívia, o que daria margem para anular o julgamento.

O promotor lembrou que o questionamento já havia sido julgado inclusive pelo Superior Tribunal Federal (STF). "Ficam dizendo que nossa história é conto da carochinha, mas a testemunha que tanto anunciaram, eles nem trouxeram", afirmou o promotor.

A testemunha em questão é Gavino Cabreira, proprietário da fazenda onde Célio alegou estar trabalhando, localizada a 15 quilômetros da fronteira com a Bolívia.

"Querem que acreditemos que Célio, portando US$ 1,5 mil e uma espingarda calibre 12 estava simplesmente trabalhando na fazenda pela manhã. Ele tentava atravessar a fronteira de volta ao Brasil, caso contrário, para que precisaria de uma identidade falsa e de uma arma?", questionou o promotor.

Caldas alegou que Gavino estava em San Matias e não conseguiu comparecer ao júri por motivos de doença. Ele chegou a pedir à juíza Elza Yara Ribeiro para consultar aos jurados se gostariam de verificar em diligência a situação de Gavino, caso seu depoimento fosse considerado necessário. Os jurados entenderam que o fato não alteraria o resultado e que a medida somente atrasaria o julgamento, que teria de ser suspenso.

"Com certeza Célio atravessaria a fronteira por uma estrada altamente vigiada pela guarnição", afirmou Caldas em tom de ironia.

Ele ressaltou que seu cliente foi capturado dentro da fazenda onde trabalhava e, para isso, apresentou o documento de autoridade boliviana em que Gavino presta queixa de invasão de sua propriedade. "Dois dias depois da prisão de Célio, as autoridades daquele país encontraram o cadeado da porteira arrebentado, com indícios de utilização de arma de fogo, além de um revólver calibre 38", explicou o advogado de defesa.

De volta a Cuiabá - Depois de passar 2 anos cumprindo pena no presídio federal de Campo Grande, Célio Alves afirmou que muita coisa mudou em sua vida ao retornar à Penitenciária Central do Estado, em Cuiabá. "Só tenho direito a uma visita por semana, enquanto os demais têm 2. Além disso, estou sem banho de sol e sou o único que não tem ventilador e televisão".

Desde janeiro, ele se encontra na unidade mato-grossense.

Apesar disso, a visita da filha, de apenas 4 anos, passou a ser constante. "Quero agora poder ver meu filho, de 17 anos. Eles nunca autorizam, mas já estou buscando meus direitos em juízo".

Mais magro, mas com aparência serena e tranquila, Célio afirmou que tem convicção na sua libertação. "Tenho certeza de que serei solto".

Quando isso acontecer, ele afirma que buscará as várias promessas de emprego que lhe são ofertadas. "Tenho muitos amigos, oportunidade não me falta".

A ideia é montar um negócio próprio, trabalhar como motorista ou voltar a cuidar de fazendas na Bolívia. "Eu não queria voltar para o Brasil, né? Querer ser livre não é crime".

Hoje, ele se diz vítima de pessoas que têm interesse em acusá-lo de crimes que não cometeu. "Um amigo meu, de minha confiança me entregou. Eu fui sequestrado na Bolívia".

Ele não revelou o nome, mas disse que o amigo em questão é brasileiro.

Por conta de sua prisão, ele afirma que sua família vive com alguma dificuldade. "Sempre tem, mas meu filho já tem a casa própria, graças a Deus".

Célio acredita que a imprensa, ao retratar seus julgamentos, acaba colaborando com a ideia de "monstro" junto ao imaginário popular. "Quem tem mais perigo: eu, acusado de matar 6 dúzias de canalhas ou aquele policial que esta preso em Santo Antônio, acusado de violentar 12 crianças?", indagou.

Para contrapor a informação, ele lembrou que vem de origem humilde. Sua família é originária do assentamento Roncador, interior de Cáceres. "Meu pai morreu assassinado por disputa de terras quando eu tinha 2 anos. Passei a infância e adolescência na cidade. Somente aos 19 anos fui para Cuiabá e depois acabei na PM". Sobre a corporação, ele afirma não sentir saudades.

Questionado se isso não seria uma forma de arrependimento, ele nega. "Se eu disser que tenho arrependimento vou estar de alguma forma admitindo a culpa, né?".

Célio garante que já foi acusado de muita coisa que não cometeu, inclusive pelo ex-companheiro de atividade, Hércules de Araújo Agostinho. "Não falo com ele, mesmo assim, ele me dirige a palavra: hoje ele me desejou boa sorte".

Hércules está em uma cela em frente à de Célio.

Para o futuro, ele pretende cursar a faculdade de História, por que gosta muito de ler, atividade que ocupa a maior parte do seu tempo. "Prestei o Enem mais ainda não sei o resultado".

Durante a entrevista, ele citou palavras do mundo jurídico e classificou magistrados e promotores de sofistas. "Não adianta eu falar que não acreditam em mim. Eles têm o poder de colocar as coisas no papel e transformar em verdade".

Transferido de Cuiabá por avião da Secretaria Estadual de Justiça e Segurança Pública, Célio retornou a Capital via terrestre, no camburão do sistema prisional, por conta do horário avançado, que não permite operação da pista de voo de Cáceres.





Fonte: A Gazeta

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