Circo marca novo espetáculo de Deborah Colker

O primeiro espetáculo de Deborah Colker após sua passagem pelo Cirque du Soleil --ela dirigiu o espetáculo "Ovo" (2009) da companhia canadense-- não vai frustrar aqueles que esperam coreografia com acento circense.

Mas também não deixa de lado uma reaproximação mais contundente: com a técnica e a precisão do balé clássico.

Pelo contrário. "Tatyana", que estreia hoje no Festival de Curitiba, experimenta um resgate de linguagem das obras do século 19, como se propusesse uma estética vintage. Deborah agora parte da vontade de compor uma coreografia narrativa, com personagens.

Para tanto, ela se inspira em um clássico da literatura russa, "Evguêni Oniéguin", romance em versos publicado em 1832 por Aleksandr Púchkin (1799-1837).

Quatro personagens saltam do livro para o palco: Oniéguin, jovem e rico, chega de São Petersburgo a uma cidade interiorana, encanta Olga e Tatyana, mas provoca o ciúme de Lenski, e o mata em duelo.

"Isso não significa que o público vai acompanhar uma historinha", contorna Deborah. "Estava mais preocupada em representar a atmosfera da emoção, falar sobre como o desejo pode ser cruel; sobre como a vida é ter de administrar nossos desejos."

Com música de Rachmaninov, Tchaikovski, Stravinski, Prokofiev --e uma inserção de Kraftwerk quebrando o repertório erudito-- o espetáculo tem dois atos.

A interferência do cenógrafo Gringo Cardia, velho parceiro de Deborah, se faz mais forte no primeiro.

A estrutura de uma árvore, cujos galhos dão suporte a uma dança extremamente calculada, delimita uma atmosfera ao mesmo tempo suave e perigosa. O risco de uma queda permeia a síntese de algo que caminha para o fim trágico. No duelo, em vez de armas, os bailarinos usam leques e bengalas.

O segundo ato, com o deslocamento da história para São Pertersburgo, é mais soturno. Também funciona como uma espécie de quebra na trajetória da companhia, com interferência mínima de Gringo Cardia.

As coreografias de Colker sempre se apoiaram na forte presença de um elemento proposto pelo cenógrafo.

Em "Rota" (1997), os intérpretes dançavam em uma roda-gigante; em "Nó" (2005), se penduravam em um emaranhado de cordas. Agora o palco está quase nu.