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Opinião
Sexta - 20 de Maio de 2022 às 06:57
Por: José Ricardo Costa Marques Corbelino

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Como sabemos em vista da acelerada profusão das tecnologias de comunicações, as possíveis e irreparáveis lesões provocadas pelo abuso no exercício da liberdade de informação, consistem em uma problemática que têm despertado o interesse de profissionais da imprensa, agentes de segurança pública, operadores e aplicadores do direito.

As inúmeras operações policiais e todas as polêmicas em torno de mandados de buscas e apreensões reservam ao tema caráter extremamente atual. Nessa perspectiva, dados transmitidos às mídias (sites, blogs), a respeito de determinadas ocorrências policiais, podem ser veiculados sem que aqueles ditos profissionais, busquem os fatos acontecidos em sua verdadeira essência.

Um dos grandes problemas vivenciados na atualidade é o equilíbrio entre o direito fundamental à informação dos cidadãos, o dever de transparência dos agentes públicos e preservação da intimidade e vida privada das pessoas investigadas e processadas.

Todas e qualquer tentativa de censura pura e seca às chamadas “entrevistas coletivas” ou mesmo “comunicado à imprensa”, “notas públicas” ou similares devem ser rechaçadas, mas não há dúvida de que as mesmas não podem ser utilizadas como um palco para a condenação midiática logo após a deflagração das chamadas ‘operações’.

Em muitos casos, em fração mínima de tempo, o cidadão, que fora apresentado à autoridade policial como um simples ‘suspeito’, tem sua face estampada em jornais, sites e programas televisivos especializados, rotulado como criminoso de alta periculosidade.

Diante desse estado de coisas, emergem alguns questionamentos e apontamentos, a saber: Na hipótese em que a divulgação de fatos, em nome da liberdade de informação, poderia antecipar os efeitos da condenação do indiciado, lesionando a presunção de inocência?

Acreditamos que a postura dos agentes públicos responsáveis pelas investigações no que diz respeito ao trato com os meios de comunicação, inclusive, o uso de redes sociais, devem ser restritas a apresentação de dados necessários para que todos saibam do que a mesma trata, quais medidas foram eventualmente adotadas na seara judicial ou extrajudicial, sempre, porém, omitindo-se de atribuir culpa antecipadamente.

Em que circunstâncias isso se daria? Quais as conseqüências dessa lesão para a vida de inocentes? Os policiais, agentes públicos e/ou autoridades constituídas que transmitem informações midiáticas à imprensa podem ser responsabilizados? Eis a indagação.


Por isso, partimos da idéia de que a Lei 13.869/2019 que versa sobre a nova Lei do Abuso de Autoridade deve ser interpretada em um ponto de equilíbrio capaz de enfrentar eventuais excessos praticados por autoridades públicas, de modo a mantê-lo dentro dos limites constitucionais para atuação estatal, mediante respeito aos direitos fundamentais de modo a evitar a criminalização midiática, especialmente no que preceitua textualmente o artigo 38, senão vejamos:

Art. 38 – Antecipar o responsável pelas investigações, por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa, antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação.

Pena- detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa


Na verdade, ao longo de todo o processo penal e antes dele, qualquer desrespeito a uma destas regras consiste em um ataque dirigido contra a própria presunção de inocência. Por essa razão, assenta a liberdade de expressão entre uma das características mais marcantes das atuais sociedades democráticas, constituindo um dos principais termômetros do regime democrático.

É nesta que se centra a liberdade de informação que assume características modernas, superadoras da ‘velha liberdade de imprensa’. Nela se concentra a liberdade de informar e é nela ou através dela que se realiza o direito coletivo à informação, isto é, a liberdade de ser informado.

Portanto, o seu objetivo da norma é impedir a difusão de prejulgamentos ou juízos prematuros, realizados antes da constituição de elementos que indiquem uma probabilidade mínima de que o investigado pode ser culpado pelo ato e que ensejam danos à sua imagem. O legislador procurou prevenir que o agente antecipasse e/ou divulgasse este tipo de juízo de valor.


A par disso, a verdadeira missão da imprensa/mídia, mais do que a de informar e de divulgar fatos, é a de difundir conhecimentos, disseminar a cultura, iluminar as consciências, canalizar as aspirações e os anseios populares, enfim, orientar a opinião pública no sentido do bem e da verdade na acepção da palavra.

Entretanto, quando certos indivíduos, principalmente aqueles revestidos de ‘autoridade pública’ são execrados, à revelia do devido processo legal, tem-se o flagrante e imoral ultraje do princípio da presunção de inocência,
digna de reflexão em claro afronte à privacidade daqueles que são submetidos à persecução criminal.


Do exposto, permite-se inferir que, ao tempo em que a Constituição Federal, no artigo 5º, LVII, assentou a presunção de inocência entre os princípios basilares do Estado de Direito, também assegurou a liberdade de informação que visa proteger o direito do cidadão de receber a informação mais completa possível sobre todos os fatos de interesse público.

Não é aceitável que se combata o crime fora das balizas traçadas pela Constituição Federal e pelas leis democraticamente votadas. Prender antes do julgamento final é algo excepcional e, rigorosamente, só tem lugar quando houver indeclinável necessidade, fora disso, temos o arbítrio e o desrespeito intolerável praticado, merecendo sistematicamente toda repulsa por parte da sociedade e dos operadores do direito, para que ela possa cumprir a sua vocação de proteger o indivíduo de abusos nas suas mais variadas formas.

A OAB está atenta!

José Ricardo Costa Marques Corbelino é Advogado em Cuiabá/MT e membro da ABRACRIM.



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