Igreja Católica enfrenta polêmica com judeus em meio à Páscoa
Nesta sexta-feira, na liturgia da Paixão de Cristo na basílica de São Pedro, o sacerdote Raniero Cantalamessa leu uma carta que disse ter recebido recentemente de um "amigo judeu". Os ataques atuais à Igreja, abalada por escândalos de pedofilia, fazem lembrar "os aspectos mais penosos do antissemitismo", afirmou o padre Cantalamessa.
Líderes judeus usaram palavras como repugnante, obsceno e ofensivo para descrever o sermão. Para piorar a situação, a declaração foi feita justamente no dia em que, por séculos, os cristãos rezaram para a conversão de judeus, que já foram considerados coletivamente responsáveis pela morte de Jesus.
"Estou completamente pasmo com isso. É uma loucura", disse Amos Luzzatto, ex-presidente das comunidades judias da Itália.
O rabino chefe de Roma, Riccardo Di Segni, que recebeu o papa Bento 16 na sinagoga da capital italiana, em janeiro, disse: "Isso é de muito mau gosto."
"Como você pode comparar o peso coletivo infligido aos judeus, que causou a morte de dezenas de milhões de inocentes, a perpetradores que abusaram de sua fé e posição ao abusar sexualmente de crianças?", perguntou o rabino Marvin Hier, do centro Simon Wiesenthal, grupo internacional de direitos judeus.
"É uma impertinência e um insulto para as vítimas dos abusos sexuais, assim como para as vítimas do Holocausto", declarou Stephan Kramer, secretário-geral do Conselho Central dos Judeus da Alemanha.
A tensão entre católicos e judeus retornou em dezembro, quando Bento 16 acelerou o processo de beatificação do Papa Pio 12I, acusado de ter permanecido em silêncio diante do Holocausto. Também aconteceram atritos no início de 2009, quando o Vaticano suspendeu a excomunhão do bispo negacionista Richard Williamson.
Críticas das vítimas
Vítimas de abuso sexual também criticaram a declaração de Cantalamessa.
"Essa tentativa ridícula de esconder os crimes da hierarquia da Igreja por trás do sofrimento dos judeus mostra até onde o papa parece disposto a chegar para impedir que a verdade venha à tona", disse Peter Isely, porta-voz de um grupo de defesa das vítimas de sacerdotes pedófilos, o SNAP (Survivors Network of those Abused by Priests)
Vaticano refuta comparação
O porta-voz do Vaticano, o padre Federico Lombardi, falando sobre a postura de Cantalamessa, disse que se tratava "de uma carta lida pelo pregador e não a posição oficial do Vaticano".
Ele disse ainda que o pregador, o padre Raniero Cantalamessa, "quis apenas tornar pública a solidariedade com o Papa expressada por um judeu à luz da particular experiência dolorosa sofrida por seu povo". Mas ele reconheceu que "o fato de citá-la poderia suscitar mal-entendidos".
O pregador do Papa, que tem a função de escrever o sermão durante o rito dedicado à "Paixão do Senhor" da Sexta-feira Santa, que se celebra poucas horas antes da Via Crúcis, havia advertido que não iria abordar o tema dos abusos cometidos por padres contra menores "porque deles já se fala muito do lado de fora".
No entanto, ao citar a carta de solidariedade de seu amigo judeu e comparar os ataques contra a Igreja aos preconceitos e à hostilidade dirigida aos judeus como grupo generalizado, o padre Cantalamessa acabou reavivando o debate.
Uma onda de escândalos envolvendo sacerdotes acusados de abusos contra crianças tem atingido a Igreja Católica em vários países da Europa. Entre eles a Alemanha, país de nascimento do pontífice, assim como os Estados Unidos, onde milhares de casos foram denunciados desde o ano 2000. Nos EUA, um advogado apresentou em uma corte de Kentucy, no centro-oeste americano, uma petição para que o papa Bento 16 deponha, sob juramento, nos processos contras os padres pedófilos.
Com agências internacionais
Comentários