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Nacional
Terça - 15 de Maio de 2007 às 08:57

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Sem alarde, o TCU (Tribunal de Contas da União) investiga um desvio que pode chegar a R$ 1,89 milhão da Dataprev, empresa de tecnologia e informações da Previdência Social. A reportagem teve acesso ao relatório parcial da investigação, que está em fase de análise dos depoimentos, e aponta o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro da Previdência Amir Lando (PMDB) como responsáveis pelas irregularidades.

O texto demonstra que para atender ao governo, a Dataprev enviou cartas aos aposentados e pensionistas do INSS desprezando os procedimentos legais, o que "provocou lesão aos cofres" públicos.

As correspondências foram assinadas pelo presidente e o então ministro da Previdência, em 2004. O conteúdo já foi amplamente divulgado e alvo de polêmica na época. Trata-se da divulgação de empréstimo com desconto em folha aos assegurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) oferecidos pelos bancos. Na época da divulgação, apenas a Caixa Econômica Federal e o BMG --investigado no escândalo do mensalão, prestavam o serviço.

Além de questionarem o conteúdo da carta que beneficiava o BMG, os técnicos do TCU descobriram também que o processo de emissão e envio das correspondências "foi marcado por diversas irregularidades e procedimentos atípicos, despesas ilegais e sem cobertura contratual, que provocaram lesão aos cofres da Dataprev". É isso que o TCU analisa agora.

Isso porque o procedimento de confecção e envio das cartas foi feito sem que a Dataprev apresentasse proposta comercial ao INSS. Procedimento que só foi adotado em 27 de outubro de 2004, quando 3,3 milhões de correspondências já tinham sido enviadas para postagem.

Segundo o relatório do TCU, a proposta comercial tinha como objetivo "regularizar o processo de expedição das cartas", mas o INSS não respondeu se aceitava ou não o "contrato". Mesmo assim, a Dataprev continuou a enviar as cartas.

Na proposta, a Dataprev informava que seriam "impressas e enviadas" 17 milhões de cartas ao custo de R$ 2,90 milhões o serviço --R$ 0,17 por carta-- ainda sem computar o custo da postagem.

Em 14 de dezembro, o então chefe de gabinete do ministro, José Cláudio Murat Ibrahim, encaminhou mensagem a Dataprev na qual questionava a impressão do material "sem qualquer procedimento administrativo" e determinou auditoria interna.

Questionado, o presidente da Dataprev, José Jairo Ferreira Cabral, rebateu e disse que foi o próprio chefe de gabinete do ministro quem, "por reiteradas vezes, solicitou urgência no encaminhamento das correspondências" e de forma "cristalina" solicitou que a Dataprev efetuasse o serviço.

Diante das divergências, a Dataprev suspendeu o serviço em dezembro e mandou, em 6 de setembro de 2005, destruir 510.625 que haviam sido impressas, mas não postadas. Até então, haviam sido emitidas 10.657.233 cartas, ao custo de R$ 1,89 milhão somente para impressão. O TCU não calculou o prejuízo aos cofres públicos com as cartas que foram destruídas, por considerar difícil chegar a uma estimativa confiável.

O custo da postagem chegou a R$ 7,627 milhões, conforme o documento do TCU. O documento informa que o INSS arcou com a despesa de postagem, o que chamou a atenção dos técnicos. "É questionável que a Previdência custeie a remessa de milhões de correspondências que não guardam correlação com suas prioridades institucionais."

Para confeccionar as cartas, a Dataprev utilizou 34 mil resmas de papel e 566 frascos de toner de tinta (usados em impressoras).

"A Dataprev arcou com os custos da emissão e impressão das cartas, uma vez que o INSS não aceitou a proposta comercial. A impressão e a postagem das cartas foi realizada sem amparo contratual, sendo assim ilegais as respectivas despesas, caracterizando-se ato de gestão ilegal, ilegítimo e antieconômico", diz o documento do TCU.

Ao TCU, a Dataprev insistiu que atendeu a uma demanda do gabinete do ministro que foi "colocada como urgente e imperativa".

Segundo o ex-diretor de operações da empresa Carlos Alberto Jacques de Castro "houve empenho do ministério exigindo a execução" ao ponto de "provocar constrangimento".

Para o TCU, o presidente, o diretor de negócios e o diretor de operações da Dataprev tinham conhecimento das irregularidades no procedimento "tanto que mandaram suspender o processo".

Além dos dirigentes da Dataprev e do ministério, o TCU também responsabiliza o presidente Lula porque ele assinou as cartas. Considera ainda que o conteúdo é enganoso uma vez que nela se diz que foi por causa de uma lei do atual governo que os aposentados passaram a ter direito a empréstimo em folha. Essa possibilidade já era dada em 2003 --a lei da carta é de 2004.

Para a oposição, é mais um caso de crime de responsabilidade do presidente, com o agravante de que, desta vez, o presidente Lula não poderá dizer que não sabia do que se passava.

"Lula já cometeu tantas irresponsabilidades na presidência que o impeachment teria fundamentação fácil. Esse é mais um crime de responsabilidade. A gravidade é que tem a assinatura dele e ele não pode dizer que não sabia", disse o presidente nacional do PPS, Roberto Freire (PE).

Ele observou ainda que "não se trata de denúncia de partido de oposição, mas do TCU".

Outro lado

O advogado geral da União, ministro José Antonio Toffoli, disse que ainda não tomou conhecimento do processo, mas adiantou que "o fato de ter assinado a carta não implica em nada" ao presidente Lula. "Não há possibilidade de vincular uma coisa [o conteúdo das cartas] com a outra [a emissão]", sustentou.

Conforme o ministro, o que foi feito com as cartas depois da assinatura do presidente não é de responsabilidade de Lula. "Duvido que o TCU manterá essa sugestão ridícula dos técnicos de que a assinatura da carta é um ato de improbidade administrativa. Não há nenhum parâmetro de razoabilidade de bom senso nisso", afirmou.

A Dataprev informou que os dirigentes investigados não trabalham mais no órgão e que iria buscar mais informações sobre o processo para se manifestar, o que não ocorreu até o momento. Os demais não foram localizados pela reportagem.

O processo está sob a guarda do ministro Aroldo Cedraz. Não há data para que seja concluído e colocado em votação.





Fonte: Folha Online

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