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Politica Brasil
Segunda - 11 de Dezembro de 2006 às 07:39

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A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que cria o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) foi aprovada em segundo turno pela Câmara no dia 6. Prevê aporte em quatro anos de R$ 55,8 milhões para o ensino básico, gradualmente, pela União, Estados e municípios.

Mas o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), historicamente ligado ao tema, não está contente. Embora admita que a situação melhore, ele considera a medida insuficiente para resolver os problemas do setor. Fundador do PT, ele foi também um dos fundadores do partido que brotou da insatisfação de setores do PT com o governo Lula. O PSOL só conseguiu eleger três deputados federais --os outros são Luciana Genro (RS) e Chico Alencar (RJ). Nesta entrevista, em série com os deputados eleitos por São Paulo, Valente identifica um traço comportamental de Lula --a aversão a enfrentamentos, que explicaria muita coisa, desde a aproximação com banqueiros e com o agronegócio, historicamente setores questionados pelo PT, até a retirada, do projeto de reforma universitária, de itens que permitiriam maior fiscalização das universidades privadas.

O ex-ministro Paulo Renato abriu esta série de entrevistas dizendo que o Fernando Haddad é o melhor dos três ministros que o Lula teve em educação.

O senhor concorda?

Ivan Valente - Fui oposição ao Paulo Renato durante oito anos. Fiz dois debates na campanha com ele. Digo sempre o seguinte: o PT foi um grande formulador de educação, tinha uma estreita relação com os movimentos educacionais. Eu apresentei o Plano Nacional de Educação em 1998, elaborado por centenas de colaboradores. E o Fernando Henrique engavetou o plano. Então eles não queriam planejar. Um plano para a educação básica, para multiplicar por quatro o acesso ao ensino superior, melhorar a qualidade do ensino, gastando 10% do PIB em educação, num prazo de 10 anos. O Congresso aprovou 7% do PIB, em 2001. E o Fernando Henrique vetou. Quando o Lula entrou, falamos: vamos derrubar os vetos. Não derrubaram. O projeto do Paulo Renato, o Fundef, é a socialização da miséria na educação. Você equaliza fundos de educação entre municípios mais pobres e mais ricos, mas não faz um aporte novo.

A complementação da União é de apenas R$ 400 milhões, para atender 40 milhões de pessoas. Agora foi aprovado o Fundeb, e o problema continua sendo esse: qual o papel que terá a educação, se haverá ou não investimento pesado. Com o Fundeb certamente melhora, porque ele vai da creche ao segundo grau, tenta atender ao conceito da Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Mas quero saber onde está o dinheiro para atender isso com qualidade. O governo federal propôs R$ 4,5 bilhões em quatro anos, gradual. Ou seja, nesse primeiro ano só vai ter R$ 900 milhões de dinheiro novo. (O aporte inicial da União no Fundo será de R$ 2 bilhões, mas o deputado leva em conta o que já é gasto no Fundef, salário-educação e "Fundebinho", verba já enviada para o ensino médio de oito Estados.) É pouquíssimo, para toda a educação básica. Já na educação superior o governo Fernando Henrique foi até mais privatista.

Não abriu uma única universidade pública nova, em oito anos. Esse foi nosso combate com o Paulo Renato. O governo Lula tinha um projeto de abrir novas. Dilatou alguns campi e criou a Universidade do ABC. Pode dizer que fez alguma coisa, mas continuou dando prestígio financeiro às privadas. Não resolveu o problema.

O senhor acha que o nome dos três ministros fez diferença?

Ivan Valente - Eles seguem a atuação do governo Lula, com suas limitações financeiras e com um plano mínimo estabelecido. O Cristovam Buarque, que aparece como grande educador, não era uma pessoa integrada com os educadores do PT, era descolado. Nenhum dos três ministros teve ponte real com os educadores do PT, com o plano de 100 dias do PT. Quando o Paulo Renato diz que o Haddad é mais técnico, é que ele não precisa deixar marcas para a carreira. Reflete menos um projeto de quem quer tirar proveito para tirar projeção política. Do ponto de vista do programa, não tem nada que não estava no horizonte do PT, que é tocar a educação com uma mixaria de recursos em relação ao que é feito para o ajuste fiscal.

O senhor enxerga promiscuidade entre interesses públicos e privados na Comissão de Educação da Câmara?

Ivan Valente - O poder da educação privada no Brasil é muito grande. Isso vem desde a Constituinte, passou pela discussão da Lei de Diretrizes e Bases. As escolas são financiadoras de campanhas de muitos deputados e são muito influentes. São verdadeiros impérios. O João Carlos Di Genio (dono do Objetivo e da Unip) morou aqui em Brasília na Constituinte. Eles têm muito poder, desde quando passou aquele artigo 209, é livre a iniciativa privada no campo educacional. Tudo se refere ao sistema público, o privado está fora. Por exemplo, a democracia interna das escolas, a eleição direta, o controle de contas. Embora sejam concessões do poder público, sujeitas à investigação, o poder deles está aqui, no Conselho Nacional de Educação. Têm sempre maioria. E também representação na Comissão de Educação. Toda luta que há aqui por aumento de mensalidade escolar eles vencem. É um poder muito grande. Apesar do reflexo disso na classe média, que forma opinião e tal --eles vencem. E nessa discussão do ProUni eles vieram, abraçaram, beleza pura.

O deputado Carlos Abicalil (PT-MT) diz que esse lobby é o segundo maior da Câmara, atrás somente dos hospitais.

IVvan Valente - Ele aparece muito quando há uma situação. Mas são importantes. Mantêm inclusive pessoas circulando dia e noite na Comissão de Educação, lobbistas, assessores parlamentares. Cuidam de todos os detalhes. Houve uma fase no governo Fernando Henrique sobre a liberalização das universidades, quando a expansão se deu de forma totalmente descontrolada, com a autorização de novos cursos, sem fiscalização...

Isso não continua?

Ivan Valente - Continua. O Paulo Renato é hoje consultor de empresas privadas.

Refiro-me ao governo Lula...

Ivan Valente - Continua. Claro que fizeram sinais... Tem pessoas que vêm de outra tradição, fizeram escola pública, etc. Mas continua. O governo Lula não fez enfrentamento. Nenhum. Nas minutas iniciais da reforma universitária a única parte progressista era a que tratava das privadas, pois aumentava a fiscalização e o controle. Caiu tudo. Na reforma universitária que está rolando por aí, isso sumiu. O Lula não quer conflitos. Assim como não quer com os banqueiros, não quer com o agronegócio, está aí inaugurando a ponte do governador Blairo Maggi, o "rei da soja"... Nada de conflito.





Fonte: 24HorasNews

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