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Cultura
Sábado - 29 de Julho de 2006 às 16:20
Por: Luiz Fernando Vieira

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Há pintores que se destacam como integrantes de determinadas correntes ou escolas artísticas. E há os que conseguem o mesmo justamente por não seguir padrões estéticos, modismos ou regras de mercado. É o caso de Paulo Pereira da Silva (ou Paulo PPS), que, lamentavelmente, Mato Grosso perdeu no último domingo, vítima de câncer. Filho de outro artista plástico conhecido, o Sitó, ele destoou do tom ingênuo que marca o trabalho do pai e balizou a carreira por uma inata visão crítica acerca de tudo o que via, ouvia ou lia, além, claro, de uma certa lascívia.

Sua pintura meio marginal o manteve afastado do que se pode chamar de primeiro time das artes plásticas mato-grossenses. Não pela qualidade, mas porque não reunia as mesmas características de seus colegas. Não se preocupava, por exemplo, em colocar elementos iconográficos da região em suas telas. Sem a preocupação de agradar as pessoas, ele muitas vezes causava uma certa repulsa pela forma até agressiva com que reproduzia as cenas ou então pela irreverência com que tratava os temas.

O artista plástico Gervane de Paula, que fez o anúncio de sua morte, na terça-feira, e foi o curador da individual realizada na galeria de artes da Secretaria de Estado de Cultura, em outubro do ano passado, considera que Paulo PPS vivia na contramão em relação aos artistas da região. "A arte que você vê hoje é muito em função do mercado, muito voltada ao gosto regional. Ele não tinha esse compromisso, era um artista espontâneo, a arte nasceu com ele". Não que ele procurasse manter-se longe das coisas de sua terra, explica Gervane. "Ele também usava as experiências regionais, só que de maneira diferente. A pintura esteticamente era subversiva, as formas, as cores, ela tinha essa tônica", diz.

O interessante é que isso não prejudicava o conjunto. Gervane considera que sua obra é bem harmonizada, apesar de não seguir padrões estéticos. Diferente dos ditos ingênuos - ou comumente chamados naïfs -, ele fugia das cenas bucólicas e concentrava-se no que estava à sua volta. Estava sempre atento aos fatos e fazia críticas a aspectos políticos e culturais de Mato Grosso. Por meio de seus quadros era possível acompanhar o que acontecia diariamente na Capital.

Gervane lembra que Paulo PPS sempre produziu muito. Mesmo doente não deixava de lado os pincéis e as telas. "Ele viveu da arte dele. Em plena saúde estava produzindo e agora no final também e com a mesma qualidade", garante. Como um artista inquieto e muito crítico, sempre fez da liberdade de expressão o veículo para expressar todos os seus sentimentos. Não importa se ironizando políticos e personalidades públicas. O importante é que a alegria nunca deixou de ser uma marca.

Foi justamente isso que o ajudou a projetar-se fora do estado, recebendo prêmios e colocando trabalhos em importantes mostras pelo país. Natural de Junqueirópolis (CE), Paulo residia em Cuiabá havia muitos anos. Começou sua carreira no final dos anos 70 e ganhou fama com sua premiação, em 1986, no X Salão Jovem Arte Mato-grossense. Depois apareceram muitos convites e prêmios. Sua arte já foi exposta em eventos como o Salão de Arte Moderna de Belo Horizonte (1987), Salão de Artes Plásticas do Pará (1986), Salão Nacional de Arte Contemporânea de Pernambuco (1987), Pinacoteca Municipal de Presidente Prudente (1988) e o Espaço Cultural Fluminense em Niterói (1988), entre muitos outros. Recentemente teve uma de suas obras selecionada para o XX Salão Jovem Arte Mato-grossense.

A última exposição, uma mistura de retrospectiva e homenagem ao artista plástico, recebeu o interessante nome "Imagens do Inconsciente - Traços Toscos e Borrões". Nela, o público pôde ter uma boa idéia de como era sua arte, colocada inclusive em uma porta de banheiro. "Um artista como Paulo não pode ter rotulado seu processo criativo. Sua performance se assemelha a um grupo de artistas do qual fazem parte Bispo do Rosário, Fernando Diniz, Antonio Potero e a cuiabana Dirce Nestor, entre outros", escreveu Gervane de Paula no catálogo. Ou seja, não perde a arte de Mato Grosso e sim a arte brasileira.




Fonte: A Gazeta

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