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Politica Brasil
Sexta - 03 de Fevereiro de 2006 às 12:19
Por: Adriana Vandoni

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De uma hora pra outra o termo cuiabania extrapolou o seu conteúdo semântico e ganhou outro contexto. Meio assim como se tivesse uma personalidade, uma identidade única e não mais fosse um conjunto de modos, costumes, tradições e raízes.

A cuiabania, ao contrário da idéia que alguns nutrem, não é composta por um grupo de pessoas nascidas em Cuiabá e pertencentes a famílias tradicionais, excluídas do poder. Não é esse o sentido do termo. A idéia é muito mais profunda que isso.

Não me agrada essa distinção entre nascidos aqui ou não. Essa concepção pode nos levar, no máximo, a nos tornarmos xenófobos. Ou quem sabe, incentivar o surgimento de skinheads caçadores de certidões de nascimento.

Para fazer parte da cuiabania independe o local de nascimento, mas é fundamental que se incorpore aos costumes locais, que se integre com a cultura. Isso não quer dizer que é preciso amar o cururu (que eu acho meio chato) ou renegar a sua cultura de origem. De forma alguma. A beleza da cuiabania é exatamente a excepcional facilidade com que agregamos os filhos de outras terras.

Certa vez fui perguntada o que considerava tradicional aqui, o guaraná ralado ou o chimarrão. Que coisa mais boba! Desde que a cidade acolheu os que vieram de fora, a nossa tradição não é só o guaraná ralado, o rasquedo, o chimarrão, cururu, o vanerão ou outra coisa qualquer. São todos esses costumes juntos. A cultura e a tradição de um povo se transformam, mesmo que lentamente, ao longo do tempo. Sofrem influências e isso é muito bom. O importante é preservar a pureza dos seus costumes para que gerações futuras possam entender de onde vieram. Daqui a um tempo isso tudo começa a se mesclar. Daí a importância da preservação. Nossos filhos e netos precisão ter guardadas estas raízes.

A cuiabania é isso, modo, costume, gosto e acima de tudo, a incrível facilidade de agregar outros povos. Não possui uma identidade física, mas cultural e assim deve ser tratada. Fico olhando os acontecimentos e a insistente busca por registros de nascimento que estejam aptos a representar a cuiabania. Que engraçado, meu pai é integrante da primeira leva, acredito eu, de paus-rodados que chegaram a Cuiabá e, no entanto, aderiu de tal forma à essência deste povo e desta terra que acabou por imprimir na sua alma todos os hábitos que podem ser considerados amostras de cuiabania. Nem por isso passou a falar “peitche”, “pintcha” ou “Brairo”. Não precisou se descaracterizar para incorporar o que na verdade não passa de um modo de viver.

Um casal de amigos que morou em Cuiabá por 18 anos teve, por razões profissionais, que voltar para sua cidade de origem e não perdemos o contato graças ao poder da internet. Pois bem, esse amigo estava me contando que ao anunciar aos seus filhos a mudança, sua menina o perguntou, muito chateada, se teria que '”deixar de ser cuiabana" e o garoto de oito anos protestou se sentindo injustiçado: "vocês moraram 18 anos em Cuiabá e eu só pude morar 8." Isso é cuiabania e nenhum deles nasceu aqui.

O valor da cuiabania é imensurável e seu significado está sendo confundido. É um imenso patrimônio cultural que deve ser preservado, mas jamais pode ser tratado como moeda política.

Na semana passada os jornais noticiaram uma lista de possíveis candidatas a vice na chapa de Blairo. Todas foram descritas como representantes da cuiabania e uma delas era minha irmã, Márcia Vandoni. Sei que todas essas indicações são prematuras e acredito que ela também deva ter ficado surpresa com a inclusão do seu nome. Mas isso não vem ao caso. Adorei e me senti orgulhosa com a sua indicação como possível vice na chapa do Governador, mas preferiria que fossem destacadas as qualidades que ela possui como profissional competente, o seu caráter firme e a sua história de honestidade e compromisso com o que faz, fatores que a tornam apta a ocupar qualquer cargo ou função e que são mais importantes e relevantes que simplesmente o lugar onde nasceu.

Cuiabania não é local de nascimento, mas um Estado de Espírito.

Adriana Vandoni é economista, especialista em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas / RJ. Articulista do Jornal A Gazeta Cuiabá / MT.

E-mail: avandoni@uol.com.br





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