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Cultura
Sexta - 20 de Janeiro de 2006 às 17:46

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São Paulo - Aos 75 anos, Claude Chabrol não consegue filmar sem “un bon petit cadavre” no set. “É a melhor maneira de chamar a atenção da platéia”, afirma o cineasta francês, assumidamente obcecado pelo gênero policial. Um dos pilares da Nouvelle Vague, ao lado de François Truffaut e Jean-Luc Godard, o autor de obras-primas como A Mulher Infiel (1969) e O Açougueiro (1970) sempre foi fascinado por assassinatos, adultérios, obsessões e perversões da alma humana. Temas que adora desenvolver sob um clima de suspense psicológico, o que levou a inevitáveis comparações com o mestre Alfred Hitchcock. “Se não aparecer um corpo, seja num livro ou num filme, sinto estar perdendo o meu tempo.”

Leitor voraz de romances policiais (“Leio tudo, desde Agatha Christie até Dennis Lehane, autor de Sobre Meninos e Lobos), Chabrol leva mais uma trama literária de assassinato às telas. A Dama de Honra, a partir de hoje em cartaz, é baseado no livro The Bridesmaid, em que a escritora Ruth Rendell retrata a obsessão de uma mulher (Laura Smet), a ponto de convencer o namorado (Benoit Magimel) a matar alguém como prova de amor. Da mesma escritora, a rainha do suspense na Inglaterra, o diretor adaptou A Judgement in Stone, num filme batizado no Brasil de Mulheres Diabólicas (1995). “Ruth e eu nascemos no mesmo ano e temos em comum o gosto por desvendar o que se passa na cabeça das pessoas. Principalmente as de mente perturbada.” A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Estado, em Veneza.

Diferentemente dos suspenses de Hollywood, suas histórias de mistério não caem nos estereótipos.

Nos EUA, onde o cinema é mais industrial, os diretores e os atores são obrigados a recorrer às convenções do gênero. Felizmente nós, da França, não precisamos cair nesse ridículo. Sempre busquei um estilo diferente de filmar, para não ser tão facilmente entendido pelos espectadores.

É por isso que o sr. joga com as aparências, tirando muitas vezes as máscaras dos personagens ao longo da história?

Sim. Gosto de estabelecer um jogo que, por um lado, estimula a identificação da platéia com o personagem. Mas, por outro, promove um distanciamento. Uma vez que a relação foi criada, procuro incentivar o espectador a ver o que há por trás, aquilo que a princípio eu não queria mostrar.

Às vezes temos a impressão de que o sr. gosta de zombar do espectador...

Só espero que isso nunca faça o público pedir o dinheiro de volta na bilheteria (risos). Sempre contei a história que tive vontade e não necessariamente a história que queriam que eu contasse.

Nunca se cansa do suspense?

Não. Há um elemento no gênero, que é o crime em si, que me permite abordar qualquer assunto. Também não me canso por tratar o suspense de forma pouco convencional. Na maioria dos thrillers, é a trama que mais importa. Mas me recuso a filmar uma história como mera seqüência de incidentes. Prefiro expressar uma idéia, que julgo original por meio dos personagens. E o suspense ainda é o gênero mais apropriado para lidar com personagens desequilibrados, os meus preferidos.

Incomoda a comparação com Hitchcock?

Ficaria muito mais incomodado se fosse comparado a um cineasta ruim (risos). Mas talvez fosse mais adequado me comparar a Buñuel, de quem espero ter me aproximado mais, principalmente nos últimos filmes. Ele é meu grande mestre.

Ruth Rendell aprovou a adaptação?

Quando lhe enviei o roteiro, ela disse ter ficado satisfeita. Espero que não tenha sido apenas por educação. No caso de Mulheres Diabólicas, adaptei o romance que ela havia escrito há uns 20 anos procurando imaginar como Ruth o teria reescrito, se pudesse atualizá-lo para a época em que rodei o filme. Ela parece ter gostado muito. A Dama de Honra, por ser muito mais recente, só exigiu que eu transportasse a ação da Inglaterra para a França.

Alguma razão particular para ter escolhido personagens mais jovens em seus últimos filmes?

É verdade que, em A Flor do Mal, o casal de jovens já tinha grande importância na trama. Mas aqui eles vão além, tornando-se o tema do filme. Essa necessidade de mergulhar no universo dos jovens é recente. O problema maior dessa faixa etária talvez seja o de estabelecer um equilíbrio entre o intelectual e emocional, a razão e a paixão.

É a mulher quem propõe o ato mais extremado no filme, defendendo o assassinato como prova máxima de amor...

Não poderia ser diferente. As mulheres são muito mais fortes e fascinantes que os homens. Estou convencido de que a mulher é o futuro da humanidade, a força que move o mundo. O melhor que os homens têm a fazer é procurar entender como funciona a sua mente. Se elas quiserem, podem facilmente nos destruir.

A Dama de Honra (La Demoiselle d’Honneur, 111 min.). Drama romântico. Dir. Claude Chabrol. Livre. HSBC Belas Artes 4 - 14h50, 17h, 19h10, 21h20 (sáb. também 23h30). Cotação: Ótimo





Fonte: Agência Estado

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