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Politica Brasil
Sábado - 19 de Fevereiro de 2005 às 15:14
Por: Érica Santana

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Brasília - Para o governador do Acre, Jorge Viana, é fundamental que um projeto de desenvolvimento sustentável para a Amazônia leve em conta as peculiaridades de cada região. Em entrevista à NBr, canal do Poder Executivo, Viana disse que não se pode ter medo de ousar e fazer, por exemplo, o manejo sustentável da floresta, assim como pensar cada estado como uma realidade diferente. "O governo do presidente Lula está com uma proposta muito concreta, que é o programa de criar florestas públicas. A Amazônia tem que ser mais bem apreciada pelo Brasil".

Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

ABr - A grilagem de terra e a falta de conclusão da reforma agrária têm sido fatores que contribuem para esses conflitos nessas terras. Quais são as políticas adotadas ou o que o senhor vai sugerir ao governo federal para que mude essa situação do Pará?

Jorge Viana - Eu, como governador de um estado da Amazônia, não posso me esquivar de dar palpite no estado do Pará. Acho que é legítimo e minha obrigação pensar na Amazônia. A primeira coisa que nós temos que entender é que a Amazônia tem realidades completamente diferentes dentro do mesmo estado e uma diferença muito grande de um estado para o outro. A realidade que eu vi no Pará muda dentro do próprio estado de uma região do sul para aquela região que se chama Terra do Meio, perto de Altamira. O que nós precisamos, para ter uma solução definitiva, é ter uma idéia de um projeto de desenvolvimento sustentável para a Amazônia que leve em conta essas diferenças, que leve em conta que no Pará o módulo agrário tem que ser diferente daquele do Acre, que tem que ser bem diferente do sul do país.

Aqui 25 hectares são suficientes para uma família trabalhar e produzir. Se nós quisermos pôr uma família para trabalhar lá no sul do Pará, o módulo talvez tenha que ser de 500 hectares ou até de mil hectares para o conjunto de uma comunidade trabalhar. Para que não tenhamos aquela ocupação burra de que faz o assentamento do Incra na Amazônia, como aconteceu nos últimos 30 anos, no qual as pessoas vão derrubando um pedaço de floresta a cada ano, não se viabilizam economicamente e a propriedade tem que ser vendida depois de um certo tempo.

Eu acho que a experiência que nós vivemos no Acre serve de referência para que outros estados possam buscar a paz fortalecendo a pequena produção, fortalecendo a população tradicional e criando um diálogo com a atividade industrial, porque nós não podemos excluir o setor industrial. Hoje, o que acontece com regiões como essa que eu visitei no Pará é que não há ninguém fazendo a mediação e há a ausência de algumas instituições que precisam estar mais presentes. O pessoal reclama muito do governo do estado e cobra uma atenção mais forte ainda por parte do governo federal. Essa presença do governo federal é que resultou na reação de bandidos, porque foram bandidos que fizeram isso com a irmã Dorothy [missionária norte-americana assassinada no dia 12, em Anapu (PA)], pessoas que estão interessadas na grilagem.

Lá, eu pude ver que talvez nem sejam fazendeiros que têm conflitos com fazendeiros e nem madeireiros que têm conflitos com madeireiros, mas pessoas que estão praticando grilagem de terra à luz do dia e que, por isso, mandaram matar a irmã.

Quando eu voltei do Pará, eu tive uma reunião com o vice-presidente, José Alencar, com o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), com a senadora Ana Júlia (PT-PA), com os deputados federais que atuam na CPI da Terra e nós demos um alarme. Primeiro, proteger a vida de três pessoas: do Chiquinho, que é o presidente do sindicato, da pessoa que é testemunha e de um outro ameaçado. Segundo, colocar o Exército e a Polícia Federal mais forte do que já se está pondo e, em terceiro, levar adiante aquilo que são as demandas, aquilo que era o pedido da irmã e que também é o pedido da comunidade.

O presidente Lula me falou que, no começo desse ano, recebeu uma carta da irmã Dorothy cumprimentando-o e agradecendo-o pelo que o governo federal está fazendo na região. Ele ficou muito sentido com essa morte, mas eu tenho certeza de que ele vai fazer um trabalho muito forte para que esse assassinato não fique apenas como mais uma morte que vai constar como resultado de conflitos agrários.

ABr - Que tipo de políticas públicas o senhor acha que devem ser adotadas em relação ao problema? O governo federal já trabalha com a questão da reforma agrária, de combate à grilagem de terras.

Viana - Há situações em que é preciso agir com a polícia, num primeiro momento. Mas a solução é outra. Por exemplo, a Amazônia tem que ser melhor apreciada pelo Brasil. vO presidente Lula conhece a Amazônia na palma da mão. A Amazônia é a maior riqueza que nós temos. Agora mesmo, o governo federal, através do ministério do Meio Ambiente, apresenta um projeto de florestas públicas, que não é alugar florestas e nem arrendá-las. É fazer com que a economia e assentamentos levem em conta a floresta e não repetir os erros do passado de fazer assentamentos, onde a primeira coisa que acontece é as pessoas que são assentadas retirarem a floresta.

Na hora em que se assina o protocolo de Quioto, não podemos continuar queimando a nossa maior riqueza na Amazônia, que é a floresta. Agora, também temos que romper com dogmas. Não termos medo de ousar, por exemplo, de fazer o manejo sustentável da floresta, de pensar cada estado como uma realidade diferente. Eu sou otimista. Que essa morte agora, que esse conjunto de mortes, sirva para pôr na ordem de prioridade a Amazônia, que é uma solução sustentável para nossos problemas.

NBr - O senhor acha que falta um pouco de organização nas terras do Amazonas para que os industriais sejam beneficiados, mas também para que não haja devastação?

Viana - Primeiro, nós temos que reconhecer que, nos últimos 30 anos, houve uma sucessão de erros e equívocos por parte das políticas públicas, principalmente do governo federal. O governo do presidente Lula começa a inverter isso. Temos raras exceções que foram frutos de conflitos dos movimentos sociais. O governo do presidente Lula e o próprio ministério do Meio Ambiente está com uma proposta muito concreta, que é o programa de criar florestas públicas. Eu acredito que a maneira mais eficiente de defender o meio ambiente, de acabar com a grilagem de terra da Amazônia e de ter uma atividade econômica sustentável na Amazônia é encontrarmos uma maneira de explorar a riqueza da floresta de forma sustentável, como, aliás, estamos tentando fazer no Acre.

A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) elaborou um projeto inspirado no que nós estamos fazendo no Acre, agregado com outros conhecimentos que estão sendo feitos em outros países, para que possamos iniciar um programa de concessões de manejo florestal sustentável na Amazônia e, com isso, combater o desmatamento e a grilagem de terra e criar uma atividade econômica sustentável. Eu ponho muita fé nesse projeto, que vai chegar ao Congresso nos próximos dias.



Colaborou Juliana Andrade





Fonte: Agência Brasil

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