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Meio Ambiente
Domingo - 08 de Agosto de 2004 às 21:26
Por: Maurício Hashizume

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Brasília - As palavras da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, na última consulta pública realizada semana passada na capital nacional sintetizam o posicionamento do governo federal com relação à pavimentação da Cuiabá-Santarém (BR-163): "Uma estrada no meio da mata pode destruir culturas, inúmeras espécies, a beleza e a grandeza de ser da maior floresta tropical do mundo. Mas pode também construir novas relações, paradigmas, novas formas de fazer uma ponte entre o desenvolvimento e a preservação, entre a tradição e a modernidade".

De fato, a obra está cercada de grande expectativa. Em reportagem publicada em sua penúltima edição, a revista inglesa The Economist afirma que será um “milagre” se o Brasil conseguir aliar o desenvolvimento econômico da região com a proteção à “indispensável Amazônia”. “O projeto de uma estrada na Amazônia pode ser a mais significativa tentativa de reconciliar crescimento e conservação”, define o respeitado semanário.

Para o coordenador do grupo de trabalho interministerial (GTI) que elaborou o Plano de Desenvolvimento Sustentável para a Área de Influência da BR-163, Johannes Eck (Casa Civil), o setor do agronegócio – que pretende reduzir em R$ 2,80 o preço no frete da saca de soja com a conclusão da obra – não será o único beneficiado. Ele lembra que o asfaltamento contribuirá também para o escoamento da produção das indústrias da Zona Franca de Manaus. “Hoje, o Nordeste brasileiro compra milho argentino porque chega mais barato”, exemplifica, sublinhando que com a BR-163 pavimentada essa importação não será mais vantajosa.

Pelo menos 14 empresas, segundo a assessoria do Ministério dos Transportes, já estariam interessadas em participar da licitação da obra de asfaltamento da BR-163. Já ficou acertado que apenas caminhões com mais de 3 toneladas de carga pagarão os pedágios da rodovia que retornarão aos bolsos dos investidores. Não será cobrada tarifa de carros de passeio.

“O licenciamento da obra está nas mãos do governo, mas estamos conversando permanentemente com a sociedade civil”, afirma Eck sobre o contole social do processo. “Fizemos propostas de implantar um fórum regional e vários fóruns locais relativas ao plano. Em cinco dos seis locais onde foram realizadas as consultas públicas, foram formados embriões dessas instâncias que foram chamados de comissões provisórias”, anuncia.

O fortalecimento dos fóruns faz parte do rol das principais reivindicações das organizações da sociedade civil. “O plano apresentado pelo governo ainda é muito geral. Por isso, precisamos manter as cobranças e garantir um efetivo controle social da obra. Para isso, defendemos que os fóruns [regional e locais] sejam deliberativos e não apenas consultivos para contemplar os diversos interesses da sociedade civil”, declara Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental (ISA).

“Vamos esperar até a definição da licitação para depois definirmos como se dará a relação do consórcio [de empresas construtoras] com os fóruns”, promete o coordenador do GTI. Um Observatório de Sustentabilidade formada com o apopio do Executivo já começou a reunir análises de organizações governamentais e não-governamentais que se integram em rede para trocar informações.

Alguns dos dados coletados comprovam uma forte incidência de desmatamento ilegal no Norte do Mato Grosso, região cortada pela BR-163. Imagens captadas por equipamentos de alta tecnologia que permitem o acompanhamento e monitoramento das condições ambientais praticamente em tempo real dão conta dos altos índices registrados nos meses de maio e junho. “Isso nós não podemos mais admitir”, avalia o representante da Casa Civil.

O desafio está colocado. O asfaltamento da BR-163 pode, segundo projeção concluída pelo ISA e pelo Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia (Ipam) em 2000, devastar 22 a 49 mil km2 de florestas praticamente virgens em um período de 35 anos. Separado por diferentes regiões definidas por análises ambientais, históricas e econômicas, o estudo fez uma estimativa com base nos índices de migração verificados na Rodovia Belém-Brasília. A mesma projeção prevê que os investimentos da presença do Estado na região da Cuiabá-Santarém deve começar a fazer diferença significativa na redução do impacto sobre o meio ambiente cinco a dez anos depois do início da obra.

De fato, uma das principais preocupações das entidades ambientalistas está no calendário. “Não vemos como a licença [prévia para o início do processo de licitação da obra] pode ser dada sem que as ações estruturantes [emergenciais] estejam prontas. Esse descompasso já está ocorrendo”, alerta Ane Alencar, pesquisadora do Ipam. E a corrida contra o tempo também não pode deixar de respeitar – é claro - a própria mãe natureza que presenteou o Brasil com a Floresta Amazônica. O governo tem apenas três meses para concluir os trabalhos de campo, pois a estação das chuvas intensas (que deixa as estradas intransitáveis) tem início em dezembro. Depois, só em maio, data indicativa para o início das obras.




Fonte: Carta Maior

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