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Meio Ambiente
Sexta - 09 de Julho de 2004 às 10:04
Por: Herton Escobar

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São Paulo - Um impasse de mais de dois anos sobre uma parceria com os índios craôs, do Tocantins, pode decretar o fim do Grupo de Plantas Medicinais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

A equipe, chefiada pelo médico Elisaldo Carlini, identificou uma série de plantas com potencial farmacológico e fez um contrato pioneiro para garantir a participação das aldeias em qualquer lucro obtido a partir de suas pesquisas. Por uma série de complicações legais, entretanto, o acordo nunca foi executado. E as pesquisas pararam.

"O grupo caiu a praticamente zero", conta Carlini. "Colocamos todas as nossas fichas nesse projeto."

Amostras importadas

O único trabalho da equipe agora é baseado em três plantas populares que ocorrem no Brasil, mas cujas amostras tiveram de ser importadas do México, para evitar as complicações de se fazer a coleta no País.

"É o único jeito que encontramos de continuar a trabalhar no Brasil", diz o médico. "A lei nos amarra completamente. Qualquer planta que quisermos estudar por aqui, sabemos que vamos ter problemas."

As duas empresas nacionais que seriam parceiras no projeto retiraram sua participação e até a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) abandonou o projeto. Cada parte daria 50% das verbas para a pesquisa, orçada em R$ 1,5 milhão. "Já comunicamos a desistência do projeto", disse Carlini.

Tradições e bioprospecção

O caso tornou-se emblemático das dificuldades de se fazer bioprospecção no País - atividade que busca na biodiversidade a matéria-prima para o desenvolvimento de novos medicamentos e produtos. A complicação deve-se ao fato de que o uso desses recursos está muitas vezes associado ao conhecimento de comunidades tradicionais, como é o caso das plantas medicinais dos craôs.

A primeira lei para regulamentar a bioprospecção só surgiu em agosto de 2001, com a Medida Provisória 2.186, que criou o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN) e determinou que as comunidades devem ter participação nos lucros de qualquer produto criado com base no seu conhecimento.

O contrato da Unifesp com os craôs já previa essa participação, mas era anterior à MP. "A universidade fez a prospecção com a melhor das intenções, mas no meio do caminho surgiu a medida provisória e o acordo teve de ser adequado à legislação", disse uma fonte do Palácio do Planalto, que trabalha pela retomada do projeto.

Proposta de compensação

Por intermédio do Ministério da Justiça e da Fundação Nacional do Índio (Funai), o governo apresentou recentemente uma nova proposta de contrato para a Unifesp. Mas as negociações até agora foram pouco produtivas.

Propostas anteriores, segundo Carlini, pediam que a Unifesp comprasse jipes e montasse postos de saúde dentro das comunidades, que atenderiam pacientes com base na medicina tradicional craô.

"Uma escola médica oficial não pode construir uma enfermaria e dar atestado para um medicina não oficial", diz o professor. "Não temos verbas para isso nem era esse o objetivo do projeto."

A lógica, segundo a fonte do Planalto, é que as comunidades recebam algo em troca pelo seu conhecimento, independentemente de isso resultar em algum produto ou não. "São informações acumuladas ao longo de séculos e que são repassadas para encurtar o caminho e o custo das pesquisas. É algo que precisa ser reconhecido."

33 processos

A única autorização de coleta para fins de bioprospecção concedida pelo CGEN até agora foi para a empresa Extracta Moléculas Naturais, do Rio, há duas semanas. Outros 33 processos estão em tramitação, quatro deles em vias de aprovação, segundo o secretário-executivo do conselho, Eduardo Vélez.

"Há uma dificuldade por natureza em todos os casos que envolvem conhecimento tradicional", afirma ele. "Tivemos complicações no início, mas hoje as regras estão bastante claras e acredito que teremos um novo panorama de autorizações até o fim do ano."




Fonte: Estadão.com

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