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Politica Brasil
Quarta - 23 de Junho de 2004 às 19:12
Por: João Carlos Caldeira

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Nesta semana, a revista Veja lançou uma edição especial com o título “Jovens” e mostra em 82 páginas (incluindo as 8 de publicidade das empresas de telefone celular), todas as angústias, preocupações e desejos da geração “Fala Sério”.

Alguns números me surpreenderam positivamente. Mais de 80% deles condenam o aborto e são contra a descriminação da maconha; 97% acreditam em Deus e estão envolvidos com alguma religião e 32% dos jovens entre 14 a 24 anos (quase 11 milhões) demonstram espírito empreendedor, de acordo com pesquisa do Instituto Cidadania.

É claro que a reportagem está dirigida à classe média e média alta (público alvo que assina e lê a revista) e traça um perfil dos jovens privilegiados deste país. Infelizmente a reportagem não aborda um grave problema e uma das grandes feridas da sociedade brasileira: a exploração do trabalho infantil e juvenil. Quando falamos no assunto, logo vem a nossa mente, crianças trabalhando nas carvoarias do nordeste, nas lavouras do interior do país ou dos catadores de papeis de São Paulo e esquecemos que a exploração se dá bem perto de nós.

Mato Grosso, Cuiabá e as principais cidades do estado, não estão livre desse problema. Muitas vezes fazemos vista grossa, quando nos interessa, outras vezes simplesmente ignoramos, para que nossas consciências possam dormir tranqüilas. Se prestarmos atenção, veremos crianças trabalhando (formalmente ou não) nas ruas de quase todas as cidades deste estado. Algumas empurrando um carinho de picolé, outras catando latinhas, outras pedindo dinheiros nos semáforos e tem até algumas em ambientes da alta sociedade, como nos clubes e academias de tênis de Cuiabá.

Na maioria das vezes os exploradores são os próprios pais, que dependem do dinheiro obtido com o trabalho informal dos filhos menores para sustento do lar. Sinceramente, ainda tenho dúvidas do que é pior, se a crianças trabalhar (em condições dignas e seguras, é claro) ou viver pelas ruas, sem educação, sem assistência da família ou do estado, se envolvendo com drogas e outros delitos. Há poucos dias, quando saía de um cinema no Shopping Três Américas, por volta das dez horas da noite, conversei rapidamente com um “guardador de carro”. Era uma criança de aproximadamente 8 anos, que mora no bairro Osmar Cabral (nos fundos do Tijucal) e que “trabalha” quase todas as noites nas imediações do Shopping. Disse-me ainda que fatura entre R$-12 a R$-15 por noite e que vai embora de ônibus no Corujão da Meia-noite. Façamos algumas contas rápidas: trabalhando apenas 5 noites por semana, a criança ganha R$-270 num mês (é isso mesmo, mais que um salário mínimo reajustado). Essa criança tornou-se um empreendedor com 8 anos!

Ganha mais que muitos chefes de família! Tudo bem que desse valor ele tire algum para um lanche e guloseimas, mais em compensação não deve pagar o transporte (passa por debaixo da roleta do ônibus).

Para essa e muitas outras crianças é um “excelente” trabalho, mais que isso, é a possibilidade que a vida lhe deu para sobreviver, para sonhar. Mesmo que de maneira insensata, mesmo que não passe de uma ilusão infantil, mas é a única que lhe é oferecida.

Fico muito orgulhoso quando vejo que Mato Grosso é o maior exportador disso, maior produtor daquilo e que é uma potência no agronegócio; mas ficarei mais feliz e realizado no dia em que não tenha uma criança se quer, trabalhando nas ruas.

João Carlos Caldeira Empresário, jornalista, especialista em administração de turismo, hotelaria e lazer. E-mail: joaocmc@terra.com.br




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