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Agronegócios
Quarta - 15 de Maio de 2024 às 06:50
Por: Lidiane Moraes/Redação Primeira Página

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Nesta quarta-feira (15) tem início um período conhecido na agricultura como vazio sanitário da soja. São 90 dias sem plantas vivas, a fim de evitar o surgimento da ferrugem asiática, e de preparação para o início do plantio em 16 de setembro.

O vazio sanitário foi instaurado há quase 20 anos e, segundo o consultor agronômico Evaldo Takizawa, ainda é a medida mais eficaz e inteligente que o agricultor pode usar para manter a lavoura livre do fungo causador da ferrugem.

vazio sanitario okLavoura sem plantas vivas – vazio sanitário é assim. (Foto: reprodução)

De acordo com dados do Indea (Instituto de Defesa Agropecuária), na safra 2022/2023, em Mato Grosso, foram plantados mais de 10 milhões de hectares de soja.

Naquele ano, o órgão realizou 5.864 inspeções, em pontos estratégicos. Destas ações de fiscalização resultaram 67 autos de infrações.

E dos 4.790 hectares inspecionados, 0,04% total de áreas foram autuados durante o vazio sanitário da soja em 2023. Foram coletadas 561 amostras e cerca de 33% tinham vestígios da ferrugem asiática.

O engenheiro agrônomo João Batista da Silva Júnior, responsável pelo Programa de Pragas de Importância Econômica do Indea, explica que o percentual pode parecer baixo, em princípio, mas não é, se considerado o potencial destrutivo da doença.

Contexto histórico

Os agricultores que sobreviveram ao início da década de 2000 conhecem o quão avassaladora é a ferrugem asiática e os prejuízos gigantescos que ela causou às lavouras de Mato Grosso, entre os anos de 2001 e 2005.

Logo depois do surgimento, em 2001, a ferrugem se alastrou por diversas lavouras do estado. Um dos municípios mais afetados foi Primavera do Leste, a 239 km de Cuiabá.

Dois fatores, segundo o pesquisador Evaldo Takizawa, contribuíram para a evolução da doença nas plantas de soja daquela região. Um deles é que o período entre junho e setembro era usado para o plantio de algumas variedades com o objetivo de produzir sementes.

Design sem nome 42Plantas com ferrugem asiática. (Foto: reprodução)

Outra questão era as lavouras irrigadas. Além do organismo vivo, o fungo precisa de condição climática favorável para sobreviver. Neste caso, a combinação do calor característico de Mato Grosso e a umidade propiciada pelos pivôs foram elementos significativos para o avanço da doença.

A partir da identificação dos primeiros prejuízos, instalou-se uma batalha em busca de soluções. A pesquisa foi de suma importância para se chegar às alternativas. Estudos sobre a eficácia dos fungicidas, o desenvolvimento de variedades resistentes, tudo isso continua sendo um desafio para a ciência.

“No primeiro ano de infestação, os prejuízos foram menores, porque a ferrugem foi detectada no final, quando as plantas já estavam maduras. No segundo ano, o impacto foi bem maior e, no terceiro, já se pensou no vazio sanitário. Era impossível produzir com a existência da ferrugem. A doença resistia aos fungicidas e o Doutor José Tadashi Yorinori orientava que não era recomendado produzir com mais de 3 aplicações de fungicidas, do ponto de vista da sustentabilidade. O processo em Primavera, por exemplo, estava saturado. Naquela época, era impossível produzir com menos de 6 aplicações”, relembra Takizawa.

Entre os anos de 2003 e 2005, segundo o engenheiro agrônomo Neri Ribas, os produtores da região de Primavera chegaram a perder de 10 a 15 sacas por hectare, em razão da doença.

“A partir da introdução do vazio, a situação foi controlada. Naquele tempo, não era uma questão de gasto com fungicidas, todos estavam dispostos a comprar os fungicidas necessários, mas não era uma medida sustentável e nem resolutiva. Então, era uma questão de comprometimento da produção, comprometimento da economia do estadual, comprometimento da atividade”.

Com a introdução do vazio sanitário da soja, a uma doença passou a ser controlável dentro das técnicas agronômicas, “porque do jeito que estava era insustentável, do ponto de vista da sustentabilidade e todo o processo envolvia a microbiologia dentro do agroecossistema da produção de soja que colocava tudo em risco”, explicou Takizawa.

lavoura Ferrugem aibaLavouras atacadas pelas ferrugem. (Foto: reprodução)

Situação atual

Na safra 2023/2024, segundo o Indea, foram inspecionadas 16.367 unidades de produção de soja, em mais de 11 milhões de hectares plantados.

Foram coletadas 416 amostras, onde 1,8 % de folhas tinham ferrugem. “Há que se considerar que nesta safra, as condições climáticas foram atípicas, o tempo seco e a falta de chuva contribuíram para que a doença não tivesse como se desenvolver”, explicou ele.

Atualmente, a partir do vazio sanitário há um limite (potencial de inóculo) – quantidade de organismo que conseguem sobreviver, ficando esse tempo sem plantas vivas no campo, e que não compromete o desenvolvimento da lavoura.

“Também com o estabelecimento do calendário, hoje, o controle pode ser feito e a lavoura protegida com fungicida. Se houvesse lavoura novas em março, seria mais difícil. Essa doença que não vai acabar. Na América do Sul se mantém viva, em razão da janela diferenciada, então, é necessário manter as medidas que têm garantido ao produção agrícola em Mato Grosso, neste tempo todo”, ressalta o pesquisador Evaldo.

Tanto os pesquisadores, quanto o Indea entendem que o vazio sanitário tem mantido a continuidade da produção de soja no estado. Consequentemente, mantida a lavoura, sem mantém a base econômica do estado, assim como geração de emprego, renda e a ligação entre o campo e a cidade.

“Não há que se discutir se ele [vazio sanitário] já cumpriu seu papel, ao contrário, tem que pensar nele como parte do processo, a medida mais inteligente que o agricultor pode usar”, afirma Evaldo.

A doença

A ferrugem asiática é causada pelo fungo P. pachyrhizi e pode ocasionar perdas superiores da 70% da área plantada. É uma doença que ataca a folha e vai destruindo a planta. Como parasita, depende de um hospedeiro vivo para se desenvolver e, é por isso, que o vazio sanitário tem se mostrado uma medida eficiente, pois sem planta, o fungo não se alastra.

A doença já era conhecida em outros países, mas teve o primeiro registro no Brasil, em 2001. Foi um dos temas mais estudados pelo professor doutor José Tadashi Yorinori, pesquisador da Empraba (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), que inclusive, foi um dos idealizadores do vazio sanitário, que passou a ser adotado em 2006. Tadashi faleceu em junho de 2016, aos 72 anos.





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