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Sexta - 24 de Maio de 2024 às 06:49
Por: Luiz Leite/Gazeta Digital

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Cuiabá de Antigamente/Luiz Leite

Na noite de 23 de maio de 1942 os cuiabanos vivenciavam o nascimento de um grandioso espaço dedicado à projeção de filmes, apresentações de teatro e ponto de encontro daqueles que apreciam a cultura. Localizado bem no coração da Capital, o Cine Teatro Cuiabá teve sua inauguração marcada pela exibição do primeiro filme com som na cidade. A projeção escolhida foi “A noiva caiu do céu”, comédia romântica da Warner Bros lançada um ano antes e estrelada por Betty Davis e James Cagney. 82 anos depois, o Cine Teatro Cuiabá segue como palco das variadas manifestações artísticas de Mato Grosso.


Primeiro cinema de Cuiabá, o Cine Parisien teve suas instalações no terreno onde hoje está localizado o Cine Teatro e deixou os cuiabanos órfãos de cinema após seu fechamento, em 1939. Foi então que o chefe de Estado à época, Júlio Muller, planejou a construção do Cine Teatro Cuiabá, inaugurado em 1942.

Reprodução

Cine Parisien

Cine Parisien foi a primeira sala de cinema e teatro em Cuiabá

Pouco mais de 20 anos desde da inauguração, o local vivenciava seu auge, pois em meados dos anos 60 cada cinema tinha contrato com uma distribuidora de filmes específica, o que gerava uma “guerra de apresentações” pela busca dos melhores filmes, conta Aníbal Alencastro, 81, projecionista pioneiro dos cinemas de Mato Grosso.

lencastro, nascido um ano antes da inauguração do Cine Teatro e apaixonado por cinema desde a infância, veio do distrito de Nossa Senhora da Guia para Cuiabá, onde projetou diversas produções audiovisuais em suas passagens por cinemas que marcaram história da Capital, como Cine São Luiz, no Porto, Cine Bandeirantes, na região central e o Cine Teatro.

Assessoria

Aníbal Alencastro

Aníbal Alencastro lançou livro sobre cinema e foi personagem central de documentário. Sua história está ligada ao Cine Teatro Cuiabá


Muito mais que assistir

Em todos os lugares em que chegou, o cinema influenciou diretamente no agir da população. Muito mais que assistir a um filme, ir ao cinema se tornou uma experiência de encontrar pessoas, comer pipoca e exercitar o silêncio. Em Cuiabá não foi diferente. Aníbal narra, em conversa com o Gazeta Digital, que durante os anos 50 e 60 os cuiabanos viviam o cinema, sendo esse o principal meio de comunicação da época.

“O cinema era tudo pra nós. Ali vinha a notícia, porque além dos filmes que vinham, vinham também os noticiários, os documentários. Inclusive, tinha muito especialista em futebol”, diz Alencastro, que relembra a influência dos filmes no cotidiano da população cuiabana, em especial entre os jovens, que buscavam se vestir, portar e até falar como os personagens representados nas telonas.

Reprodução/Cuiabá de Antigamente

Cine teatro Cuiabá

De criança a idoso

“Tinha cinema o dia todo”, conta o ex-projecionista, que relembra a fila de crianças e adolescentes formada a partir do meio-dia na portaria do cinema, para assistir aos filmes das sessões chamadas de matinês, com uma programação diferente daquela apresentada para os adultos. Além de filmes, a garotada se animava por acompanhar seriados, que eram exibidos em sequência, uma parte no sábado e outra no domingo, o que levava muita gente ao Cine Teatro.

Frequentado pela sociedade em geral, de crianças a idosos, o espaço foi mais que um local de trabalho para Aníbal Alencastro, que era questionado ao caminhar nas ruas de Cuiabá sobre a programação de filmes a serem exibidos. Ele conta ao que sempre tinha a resposta na ponta da língua.

O sucesso era tanto, que muitas vezes as sessões precisavam ser aumentadas, conforme lembra Aníbal: “Ao invés de passar uma sessão à noite, tínhamos que passar uma a partir das 18h, depois às 20h, depois às 22h. Enquanto a pessoa quisesse, a gente ainda tava passando cinema”. Ele relata que muitas vezes chegou a sair da local 1h da manhã.

No escurinho do cinema
Muito além de apenas exibir filmes, o Cine Teatro é um espaço onde muitas histórias se encontram, muitas delas de pessoas que nunca tinham ido ao cinema e que vivenciaram ali sua primeira experiência frente às telonas.

Reprodução

King Kong

Gorila gigante assustava quem ia ao cinema pela primeira vez

Aníbal se recorda dos curiosos que chegavam do interior apenas para conhecer o cinema e conta que muitos se assustavam com o tamanho ampliado da imagem aliado à potência sonora das caixas de som. “Quando nós passamos o King Kong, meu Deus do céu, quando apareceu o gorila, meu Deus, o pessoal corria e vinha ficar atrás do cinema com medo do bicho” Narra o ex-projecionista em meio a risos.

Alencastro se lembra também dos casais de namorados que aproveitavam o escuro da sala para demonstrar intensamente seus carinhos. Casais esses que eram repreendidos pelos chamados “vaga-lumes” ou “lanterninhas”, fiscais uniformizados do local que usavam uma lanterna para advertir os apaixonados mais ousados.

Com a chegada da TV no Brasil, na década de 50 e sua consolidação nos lares brasileiros ao longo dos anos seguintes, os cuiabanos passaram a deixar de lado o cinema. É o que diz Aníbal Alencastro, que lamenta: “O cuiabano ficou ligado na televisão, que já é uma coisa doméstica, ele já não precisava sair daqui para ver cinema. Então isso aí que acabou com o nosso cinema”.

O fato é que dentre os cinemas que marcaram época na Capital como o Cine São Luiz, Cine Bandeirantes e Cine Tropical, apenas o Cine Teatro Cuiabá sobreviveu como espaço que recebe projeções fora do circuito dos “cinemas de shopping”, priorizando a produção local, independentes e apresentações teatrais.

Tombado como patrimônio histórico em 1984, o Cine Teatro Cuiabá foi desativado em 1997, sob alegação de circunstâncias administrativas e sanitárias. Após 12 anos fechado, o local abriu suas portas ao público novamente, em maio de 2009. Desde então, sua gestão é compartilhada entre o governo do Estado e a iniciativa privada.

Gerenciado pela Associação Cultural Cena Onze em colaboração com a Secretaria de Estado de Cultura de Mato Grosso desde 2016, o Cine Teatro Cuiabá completa 82 anos bem vividos nesta quinta-feira (23).





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